São Paulo, domingo, 15 de setembro de 1996
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TABULEIRO NOVO

Pela primeira vez desde a redemocratização do país, o tabuleiro político dá sinais de abrir espaço para um novo jogo ou, talvez, novos lances. São três as principais características.
Em primeiro lugar, o principal confronto não é mais entre direita e esquerda, mas entre grupos, em vários partidos, que se poderia definir como centro (FHC e aliados) e posições mais à direita (caso de Paulo Maluf).
A segunda característica nova é, mais à esquerda, o anúncio de articulações iniciais visando a uma candidatura em 98 que poderia ser apoiada por vários partidos, inclusive o PT. É, de certa forma, uma característica da novidade anterior. Afinal, se a polarização entre esquerda e direita já não é essencial, o próprio PT perde a aura de novidade, pureza ou radicalismo que o marcou nos primeiros anos.
A terceira qualidade do tabuleiro torna o jogo mais difícil: é o apagamento dos conceitos tradicionais do que seja de fato direita e esquerda. Para alguns, FHC é neoliberal. Para Sérgio Motta, Maluf ainda é o mesmo da ditadura. Para Maluf, a política econômica do real é perversa socialmente e está destruindo a indústria nacional, posições com as quais provavelmente concordariam líderes da esquerda como Brizola ou Lula.
Ou seja, não apenas sumiu a polaridade entre esquerda e direita, como ficou mais difícil dizer o quê e quem é de esquerda ou direita. É como se as peças do jogo estivessem embaralhadas e as regras indefinidas.
A ascensão de Paulo Maluf dá à conjuntura um sabor de disputa entre um projeto conservador, com fortes tinturas populistas (o do próprio prefeito paulistano), e o projeto supostamente centrista da atual coalizão governante, de cor mais liberal do que social-democrata.
É um contraste entre o ocorrido nas eleições presidenciais de 89 e 94, em que a esquerda era o contraponto principal, representada pelo PT de Lula (e, em 89, também por Leonel Brizola, já enfraquecido em 94).
Agora, Brizola parece mergulhado em um ostracismo talvez definitivo, enquanto a esquerda tenta, com enormes dificuldades, superar o choque que foi, para ela, a queda do Muro de Berlim e o fim do comunismo.
Há, é verdade, ensaios de reconstrução, envolvendo intelectuais de prestígio na América Latina, como o mexicano Jorge Castañeda e o brasileiro Mangabeira Unger. Seria, aliás, positivo que a esquerda retomasse a presença que chegou a exibir em momentos anteriores. Completaria o leque de ofertas ao eleitor, o que é sempre saudável para a democracia.
É improvável que as eleições municipais alterem substancialmente o cenário, até porque a tradição brasileira tem sido a de pleitos locais produzirem muito ruído e pouca alteração prática no quadro nacional.
De toda forma, depois delas é que começará, para valer, o jogo para definir como irão mover-se as peças no tabuleiro político de 1998.

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