São Paulo, segunda-feira, 16 de setembro de 1996
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Como era gostoso meu francês

ARNALDO NISKIER

O título se repete, como se fizesse bem à nossa memória. Temos boas recordações da cultura francesa em nosso país. Antes da Segunda Guerra Mundial era predominante, inclusive entre os militares. Os nossos escritores tiveram os seus colegas franceses como paradigma. Foi a Academia Francesa que deu origem à nossa Academia Brasileira de Letras, agora às vésperas do seu primeiro Centenário.
De uns tempos a esta parte, no entanto, os ventos culturais tomaram outro rumo. O que talvez seja injustificável. Por que não pode o inglês conviver com o francês? As duas línguas e literaturas não são necessariamente excludentes.
Primeiro foi o Instituto Rio Branco que retirou a língua de Voltaire dos concursos de habilitação. O Ministério das Relações Exteriores deu à Academia Brasileira de Letras e ao Conselho Nacional de Educação explicação pouco convincente: o francês saiu do vestibular, mas será dado com toda ênfase no curso propriamente dito. Não se acredita muito nisso.
Agora é a vez do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Numa penada, de forma bastante insensível, retirou a filantropia da benemérita Aliança Francesa, única rede privada de ensino e de divulgação da língua francesa apoiada pelo governo francês e que existe desde 1940.
É um organismo, com 4 mil alunos, que não tem fins lucrativos. A Aliança Francesa do Rio de Janeiro possui filiais e um setor de cursos externos, dirigido às empresas. Tem um nítido caráter assistencial, pois investe 35% dos seus recursos financeiros em bolsas de estudo para alunos de baixa renda.
Sabem por que houve o corte? Porque os ilustres conselheiros concluíram que a Aliança Francesa, que avalia o nível linguístico dos candidatos brasileiros à Capes e ao CNPq, não é entidade de caráter educativo, mas cultural. Equívoco do tamanho de um bonde, que ruge ser corrigido pelo Ministério da Previdência.
Do ponto de vista da cultura, no Brasil, as coisas estão ficando mais difíceis. A própria Aliança Francesa, lembramos bem, já teve quase 15 mil alunos, no início da década de 80, quando reintroduzimos, na rede oficial de ensino do Rio de Janeiro, a obrigatoriedade de uma segunda língua estrangeira moderna, forma que criamos para restabelecer o francês em nossas escolas. Houve enorme vantagem na providência, depois abandonada por desídia ou ignorância.
Não se diga que há desinteresse pela cultura francesa. Quando houve a exposição das esculturas de Auguste Rodin, no Rio e em São Paulo, no ano passado, somente no Museu Nacional de Belas Artes houve o comparecimento de mais de 236 mil expectadores, recorde impressionante. O sucesso repetiu-se na Pinacoteca de São Paulo, da mesma forma como houve grande êxito na exposição das pinturas de Boudin e existe enorme expectativa pelos quadros de Claude Monet, a serem apresentados em 1997, no MNBA. O Brasil deve criar incentivos para valorizar o francês e não opor barreiras a sua livre e necessária expansão.

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