São Paulo, domingo, 22 de setembro de 1996
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Técnicos questionam balanço da Caixa

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A Folha submeteu o balanço semestral da Nossa Caixa à análise de dois especialistas em contabilidade. Se a Nossa Caixa não tivesse recorrido a opções facultadas pelo Banco Central -permitidas a todos os bancos, aliás, mas que não atendem aos princípios da contabilidade-, poderia ter registrado um prejuízo no semestre.
A Nossa Caixa não reconheceu os efeitos da inflação do período, no montante de R$ 17 milhões. Diferiu (adiou) despesas de R$ 51,6 milhões do plano de reestruturação (o que é permitido pelo BC, mas mereceu ressalva do auditor).
Os especialistas ouvidos pela Folha consideraram insuficientes as informações no balanço sobre a renegociação dos empréstimos às estatais e às prefeituras.
Estranharam os critérios para contabilizar como receita do período créditos fiscais (Imposto de Renda e Contribuição Social) de R$ 29,6 milhões. Graças a esse expediente, a Nossa Caixa registrou lucro de R$ 56,7 milhões.
Além do instantâneo
A Nossa Caixa deixou de pedir socorro ao BC desde o ano passado. No primeiro semestre deste ano, fez provisões (reservas) de R$ 83,6 milhões, diante da inadimplência de financiamentos concedidos a construtoras em gestões anteriores.
São dados positivos, mas não refletem com precisão a saúde da instituição (os balanços fotografam um momento da empresa).
Para obter projeções mais seguras, os analistas usam o índice de liquidez corrente, que mostra a capacidade da empresa de, no horizonte de um ano, gerar recursos para cobrir o que tem a pagar.
No caso dos bancos, o índice ideal é 1. A Nossa Caixa apresentou índice de 0,39 em junho. Esse índice poderia até não ser baixo, se as captações via poupança fossem utilizadas para financiar uma quantidade muito grande de mutuários, com suficiente garantia.
O problema principal é que o grosso dos recursos (quase sete vezes o patrimônio da Nossa Caixa) está concentrado num grande devedor -o Estado, que é o dono do banco- e em prefeituras.
Cano do controlador
"A Nossa Caixa e o Banespa têm o mesmo tipo de problema: o acionista majoritário, o governo do Estado, se vale dos serviços do banco e não paga na data oportuna", diz Carlos Daniel Coradi, presidente da EFC Engenheiros Financeiros & Consultores.
O problema crônico da Nossa Caixa, segundo Coradi, é a liquidez corrente baixa. Há anos, a Caixa enfrenta o descompasso entre os depósitos da poupança e as aplicações -principalmente empréstimos do banco ao setor público.
O item "financiamento imobiliário" (aquisição de casa própria pelo Sistema Financeiro da Habitação), registra operações de crédito de R$ 1,3 bilhão.
Sem comentários
A Nossa Caixa atribui a perda de liquidez à renegociação da dívida do Estado (o que teria criado um descasamento entre o que tem a receber e a pagar no curto prazo).
No final de 1994, a dívida do Estado foi repactuada, para pagamento em 240 meses. Vem sendo paga em dia, segundo a instituição. A Nossa Caixa considera que a baixa liquidez só seria um problema se houvesse uma corrida de saques, o que não é previsto.
Procurada pela Folha, a Nossa Caixa não se manifestou sobre as críticas à proposta de incorporação do Banespa. Novamente procurada para comentar os critérios questionados do balanço, sua assessoria informou que o balanço foi aprovado pelos auditores e pelos conselhos fiscal e de administração, sem restrições.
(FV)

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