São Paulo, domingo, 29 de setembro de 1996
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Canadá vira sede do teleerótico brasileiro

ELVIRA LOBATO
DA REPORTAGEM LOCAL

A proibição do serviço erótico nas linhas 900, determinada pela Telebrás em abril de 1994, tem se revelado inútil. Uma rede internacional, com bases em Israel, Hong Kong e até na extinta União Soviética ocupou o mercado brasileiro.
As empresas recrutam mulheres e homens brasileiros, no exterior, para dar atendimento, ao vivo, 24 horas por dia.
Parte dos atendentes vive em Montreal, no Canadá, onde está a maior base de operações dos serviços eróticos para o Brasil.
Essas empresas conseguem oferecer o serviço cobrando apenas o custo das ligações internacionais. Como elas trabalham de forma ininterrupta e ocupam grande número de linhas, obtêm descontos substanciais de tarifas em negociações diretas com companhias telefônicas no exterior.
Graças a estes descontos, o serviço estrangeiro custa mais barato do que os similares nacionais, que têm menos erotismo explícito. A diferença, em alguns casos, chega a 50%.
Enquanto o nacional "Tele desabafo" custa R$ 4,40 o minuto, uma ligação erótica para o Suriname (ex-Guiana Holandesa), por exemplo, custa apenas R$ 2,05 o minuto.
Existem, ainda, mais de 100 linhas de telefone com o mesmo propósito em São Tomé & Príncipe e pelo menos 80 na Guiné-Bissau .
A rota inclui, ainda, Israel, Hong Kong, Zâmbia, República Dominicana, Granada, entre outros.
Empresários do serviço 900, no Brasil, tentaram rastrear estas linhas internacionais e constataram que existe um esquema de triangulação nas chamadas.
"É quase impossível descobrir a base de operação das empresas, porque o número discado pelo usuário no Brasil corresponde apenas à primeira parte da operação triangular", afirma Francisco Martins, gerente da "Disque Namoro", sediada em São Paulo.
Em vários países, os telefonemas caem numa central que repassa as ligações, de forma automática, para um terceiro país, que não aparece na conta telefônica. Este é o caso, por exemplo, das linhas registradas na República de Moldova, cujas ligações são repassadas para o Canadá.
A reportagem da Folha ligou para dois números de serviço erótico em Moldova. Os números foram fornecidos pelo Procon, a partir de uma lista elaborada pela Embratel.
A primeira ligação (para o número 003739030033) foi atendida inicialmente por uma secretária eletrônica. A mensagem gravada, em português, dava boas vindas à "suruba global" e advertia que o serviço era proibido para menores de 18 anos.
Terminada a gravação, entrou uma mulher -gemendo como se estivesse a um segundo do clímax sexual-, que não quis dar informações pessoais, nem sobre seu trabalho no exterior. Disse apenas que era carioca.
A segunda (para o número 003739048688) caiu numa linha cruzada. Uma mulher de sotaque mineiro conversava com um homem, que dizia ter um pênis com o diâmetro de um copo. Ela parecia entediada e entremeava cada frase com o típico "uai" mineiro. Terminado o diálogo, comentou com uma colega: "Se meu noivo entra aqui e ouve isso".
Uma segunda mulher entrou na linha e se dispôs a falar com a reportagem, desde que não fosse identificada. Disse que nasceu no interior de São Paulo e que mora com o marido e dois filhos em Montreal. Só então se tornou evidente que as ligações para a Moldova eram atendidas no Canadá.
Questionada se o marido não tinha ciumes de sua atividade, ela responde: 'Èle também trabalha aqui. Para nós, é apenas um emprego".
Ela afirma que gosta do trabalho porque tem liberdade de conciliar os horários com os afazeres domésticos. "Trabalho quatro ou cinco horas por dia, enquanto as crianças estão na escola. Se tenho problemas em casa, trabalho menos, porque ganho pelo tempo trabalhado".
Ela não quis revelar seu salário, nem o nome da empresa para a qual trabalha. Disse que não sabe como funcionam as chamadas internacionais: "Para você ter uma idéia, não sei nem o número do meu telefone aqui", declarou.

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