São Paulo, domingo, 29 de setembro de 1996
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Vitória da guerrilha lança o Afeganistão ao passado

Taleban tomou Cabul e iniciou governo fundamentalista

RAYMOND WHITAKER
DO "THE INDEPENDENT"

Cabul caiu na sexta-feira: parece um despacho das autoridades coloniais britânicas na Índia do século 19. A impressão de que o Afeganistão está fora do mundo moderno, que opera sob as regras dos romances de aventura, vai ser agora reforçada pela conquista do governo pela milícia Taleban e seu misterioso líder de um olho só, Mullah Muhammad Omar.
Essa imagem também não vai ser afastada pelo seu primeiro ato -executar o líder do regime comunista afegão, Najibullah, e pendurar seu corpo em um semáforo em frente ao palácio presidencial.
Najibullah (que, como muitos afegãos, tinha um só nome), se refugiou em um escritório da ONU quando seu regime desabou, em abril de 1992, mas nem o pouco prestígio da organização pôde salvá-lo de uma vingança medieval.
O romance do Afeganistão -distante, relutante em abandonar a tradição, cheio de elaborados e selvagens códigos de honra- é também a tragédia de uma nação.
Najibullah foi apenas o último de um série de frustrados modernizadores que tentaram forçar uma mudança no país, e cujos esforços nada fizeram a não ser lançar o país ainda mais para trás.
Não só ele tentou impor uma ideologia estrangeira como se apoiou em invasores da extinta União Soviética para instalá-lo e mantê-lo no poder, unindo os afegãos contra ele.
Mas como muitos previram, os "mujahedin" (nome genérico dos guerrilheiros que combateram a URSS) conservadores que tomaram Cabul após sua queda logo se esfacelaram. Sob o comunismo a capital mantinha muitas relíquias de seu passado, mas quatro anos depois o Taleban marcha sobre uma cidade que sofreu devastação pior que Sarajevo.
As mesquitas e palácios celebrados na poesia clássica foram abandonados. Até a fortaleza que dominava a cidade, a Bala Hissar, desapareceu. Ainda que brutal e desordenadamente, Najibullah tentava lançar sua nação para o século 20, e no seu tempo as mulheres não tinham medo de usar jeans e maquiagem nas ruas da capital.
A ocupação dos "mujahedin" forçou-as a cobrir a cabeça, mas só as mais pobres ou as interioranas adotaram o "burqa", que cobre todo o corpo.

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