São Paulo, quinta-feira, 9 de janeiro de 1997
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A conta da especulação

CELSO PINTO

Em dezembro, houve uma saída recorde, de US$ 2,589 bilhões, através do mercado de câmbio flutuante. Com isso, a saída de dólares por esse mercado, no ano passado, chegou a US$ 13,475 bilhões.
O Banco Central comemorou o resultado. Como o flutuante foi o principal canal usado, no passado, por investidores externos para trazer dólares e investir no mercado brasileiro de renda fixa, a saída recorde seria um bom sinal.
Indicaria, nas palavras do diretor da Área Externa do BC, Gustavo Franco, a retirada do "capital especulativo", interessado apenas em ganhar, a curto prazo, com os juros brasileiros mais altos do que os juros internacionais. Como o ano passado também registrou um recorde na entrada de investimentos diretos, mais de US$ 8 bilhões, estaria havendo uma saudável substituição de "capital ruim", voltado apenas para ganhos a curto prazo, por "capital bom", interessado em investir na produção a prazo mais longo.
Não há dúvida que melhorou a qualidade do financiamento externo do Brasil, mas o BC exagera ao dizer que os US$ 13,5 bilhões que saíram pelo câmbio flutuante correspondem a capitais especulativos. Bancos que operam fortemente na área externa estimam que, do total, talvez metade, ou pouco menos, corresponda a retorno de aplicações antigas em renda fixa.
O resto se divide entre gastos de brasileiros no exterior com cartões de crédito e operações ligadas ao comércio (ou contrabando-formiga) de fronteira com o Paraguai. Ou seja, não é saída temporária, mas tendência mais permanente de gastos em dólares.
Houve, contudo, de fato, um aumento na liquidação de operações de investidores em renda fixa em dezembro. A razão: a previsão do início da cobrança da CPMF, o imposto do cheque, no final de janeiro.
Bancos ou investidores que tinham dinheiro externo em renda fixa e não conseguiram esticar a aplicação para prazos mais longos e boa remuneração acabaram liquidando operações em dezembro, e neste início de janeiro, para evitar pagar a CPMF.
No ano passado, houve uma redução forte e sistemática na remuneração das aplicações em dólares no Brasil. Segundo dados da Trend Análise Econômica, a remuneração dos CDIs deflacionada em dólares fechou dezembro em 18,9% ao ano, o que se compara a 33,2% em dezembro de 95 e nada menos do que 73,2% em dezembro de 94, o ano do Plano Real.
A queda é muito significativa. Mesmo antes do Real, a remuneração era muito alta. Os CDIs deflacionados em dólares renderam 28,7% ao ano em dezembro de 93 e 46,9% em dezembro de 92. Apenas em 91 as taxas anuais foram inferiores às atuais: o ano fechou com 13,1%. As taxas altíssimas de juros no Brasil para investidores externos, aliás, explicam o salto extraordinário nas reservas cambiais, de US$ 50 bilhões, desde o final de 91.
Apesar da forte queda nos juros, contudo, a remuneração do CDI deflacionada em dólar, ao longo do ano passado, ficou, em média, em torno de 25%, o que ainda é muito atraente. Como diz um banqueiro, os investidores externos estão, realmente, liquidando operações em renda fixa, mas aos poucos.
No câmbio flutuante estão também os gastos de brasileiros no exterior com cartões de crédito, que subiram fortemente. Calcula-se que, em dezembro, esse item tenha representado entre US$ 400 milhões e US$ 500 milhões.
Outro item que pesou muito em dezembro foram operações de fronteira com o Paraguai. Apesar das limitações impostas pelo BC, bancos continuam a comprar dólares pelo flutuante para vender, em troca de reais, para lojistas e pessoas que compram mercadorias no Paraguai para revender no Brasil. Calcula-se que em dezembro essas operações somaram de US$ 500 milhões a US$ 700 milhões.
Algo entre US$ 1,3 bilhão e US$ 1,5 bilhão foram saídas em dezembro de investidores externos. Para todo o ano passado, a saída teria ficado de US$ 6 bilhões a US$ 7 bilhões.

E-mail: CelPinto@wol.com.br

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