São Paulo, sexta-feira, 10 de janeiro de 1997
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Charanga e metralhas

ANTONIO CARLOS DE FARIA

Rio de Janeiro - A multiplicação dos adolescentes envolvidos com a criminalidade do Rio, mostrada pelos dados publicados ontem na Folha, é um trombone histriônico a perturbar a aparente harmonia do país.
Nos últimos dois anos, no mesmo período em que houve a queda da inflação e o aumento dos investimentos no Brasil, o número de adolescentes presos por envolvimento com o tráfico subiu de 303 para mais de 1.200, no Rio.
São os produtos mais imediatos de um ambiente de desemprego e ausência de políticas sociais.
Sem perspectivas de vida, os jovens carentes têm como modelos de sucesso os traficantes já estabelecidos em suas comunidades, que muitas vezes exercem o poder que o Estado deixa vago por omissão.
Para combater os reflexos, o secretário da Segurança do Rio propõe a distorção do espelho. Quer a responsabilização criminal de jovens com 14 anos de idade.
A proposta visa a mudança da legislação atual, que já prevê mecanismos de punição e recuperação dos menores infratores.
Mais uma vez, o problema não é falta de lei, mas o descaso na aplicação da mesma. Hoje, já não são dadas condições decentes para a formação da juventude e muito menos é destinado para a recuperação do menor infrator. Mudar a legislação não vai mudar a realidade.
Quando um menor infrator é recolhido das ruas, depois de passar pela Justiça, ele é levado para instituições de responsabilidade do governo.
Essas instituições são em regra superlotadas, não fazem a separação dos menores pela natureza e a gravidade dos delitos cometidos e, no lugar de fornecer educação e condições de recuperação, acabam funcionando como uma escola de aperfeiçoamento da criminalidade.
No início desta semana, uma quadrilha quase infantil matou duas pessoas no Rio. Os tiros das metralhadoras encobrem a charanga dos que comemoram os sucessos parciais de planos econômicos.

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