São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 1997
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O futuro da barata-robô

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

Os japoneses, especialistas em pequenos artefatos, inventaram mais um. Não é um novo fantástico disco-laser, nem um gravador microscópico: trata-se da barata-robô.
Sim, aquele inseto repelente, de espécie longeva, que nos verões ameaça os lares com seus vôos tão apavorantes quanto os de um caça supersônico iraquiano.
A Universidade de Tóquio produziu a coisa e mostrou-a ao mundo na quinta-feira. Não é um mecanismo artificial, como as formiguinhas e mosquitos que frequentam filmes publicitários, tampouco uma animação computadorizada.
A barata-robô é muito mais: uma fusão entre o organismo vivo do inseto e um organismo artificial, eletrônico.
Um microprocessador e um sistema de eletrodos foram acoplados ao corpo repugnante do bicho. Com isso, a pobre barata dirige-se para onde desejam os pesquisadores.
O feito não deve passar despercebido: é o primeiro bio-robô que se tem notícia no planeta -e tudo leva a crer que não será o último.
A ficção-científica está coalhada de exemplos semelhantes, envolvendo organismos mais sofisticados. Dos replicantes de "Blade Runner" ao policial de "Robocop", para ficarmos no cinema recente, a idéia de se criar seres "humanos" artificiais é um clássico do gênero -e nele parece dormir um sonho ambicioso do próprio homem.
O desejo de criar vida, que tem como um de seus arquétipos o dr. Frankenstein e seu monstrengo, estimula a vocação prometéica dessas estranhas criaturas pensantes que Deus inventou à sua imagem e semelhança. O homem continua querendo roubar o fogo do criador.
Lembre-se, por exemplo, de Rose, a governanta-robô de "Os Jetsons", a família futurista do desenho animado. É uma engenhoca de lata e, embora não tenha a cor, parece nitidamente feita à imagem e semelhança de uma robusta negra de "E o Vento Levou".
Mas é a negra ideal. Um sonho para a família branca americana -ou brasileira: serve eficientemente, não reclama, não exige salário, apenas baterias e fácil manutenção.
Em alguns casos a vida artificial ou semi-artificial poderia substituir a própria população de um país. Propiciaria uma enorme economia no esforço de construção de ideologias, de difusão de crenças, de inculcação religiosa ou moral.
Com uma população de bio-robôs, ditadores e líderes fundamentalistas, por exemplo, poderiam evitar transtornos como censurar imprensa e TV, promover prisões em massa, convocar pelotões de fuzilamento, abarrotar prisões.
Com o auxílio de um microprocessador e eletrodos, as atuais baratas-humanas, sejam elas as massas fanatizadas ou abobalhadas pela exclusão, fruto de longo esforço ideológico, repressivo ou discriminatório, ganhariam muito em eficiência e rendimento.
Os governos conduziriam os movimentos de seus súditos simplesmente apertando teclas. Estariam salvaguardados das nem sempre previsíveis reações do ser humano "lui mêmme".
Benvinda, portanto, essa nova contribuição asiática para um futuro... que espero não conhecer.

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