São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 1997
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Juscelino cultivou imagem de conciliador

JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL

Juscelino Kubitschek de Oliveira (1902-1976) passou para a crônica republicana como um presidente afável, não rancoroso, predisposto à conciliação que evitasse a radicalização dos conflitos.
"Há em torno disso uma forte mitologia, não só entre os que se solidarizaram com ele, por terem sido também vítimas do regime militar", diz a socióloga e historiadora Maria Victória Benevides, autora de "O Governo Kubitschek - Desenvolvimento Econômico e Estabilidade Política" (1976).
Ela nota que JK preservou simpatias dentro do próprio establishment parlamentar pós-1964, já que boa parte de seus amigos do PSD entrou para a Arena, o partido de sustentação do novo regime.
Mas a habilidade na conciliação não foi um atributo que se esgotava em si mesmo, diz outro historiador, Marco Aurélio Garcia, professor da Unicamp.
"Sarney também foi um conciliador, mas não tinha um projeto político, a não ser a obtenção de um mandato de cinco anos", afirma o historiador.
No caso de JK, "seu projeto foi bem mais visível do que ele efetivamente conseguiu fazer. Foi um presidente que fez uma enorme limonada com um só limão", diz.
FMI
Os dois historiadores apontam o mesmo episódio como exemplo de derrota que o então presidente conseguiu reverter e sair com a imagem fortalecida. Trata-se da ruptura com o FMI, em 1959.
O FMI pôs o dedo na ferida fiscal brasileira. Recusou novos empréstimos, caso o governo não equilibrasse suas contas.
Ao romper com a instituição, JK foi aplaudido pelos nacionalistas e pela esquerda, que antes criticavam sua benevolência excessiva com os investidores estrangeiros.
"A esquerda cercou o Catete (palácio presidencial, no Rio) para ovacionar o presidente. Carlos Marighella estava na manifestação", diz Garcia.
Em outros episódios, diz Benevides, JK "jogava para a platéia com seu estilo conciliador". Foi o que ocorreu com a revolta de um grupo de oficiais da Aeronáutica (Jacareacanga), em 1956.
Tão logo sufocado o levante, o próprio presidente tomou a iniciativa de encaminhar ao Congresso um projeto de anistia.
Na mesma linha, comprou na Inglaterra o porta-aviões "Minas Gerais", para neutralizar a forte oposição que encontrava entre os oficiais da Marinha.
Outro exemplo: a revista "Maquis" publica, em setembro daquele ano, fotomontagem em que o ministro da Guerra (do Exército), Henrique Lott, aparecia com o uniforme de presidiário, por suposta compra superfaturada.
O chefe da polícia no Distrito Federal, responsável pela censura, apreende a edição da revista e prende os jornalistas. JK determina em poucas horas que todos sejam soltos, em nome da liberdade de expressão.
Golpe
Mas não foi um personagem infalível. Em 1964, após a queda de João Goulart, acreditou que os militares haviam tomado o poder para uma curta transição, e que o calendário eleitoral seria mantido.
As eleições presidenciais estavam marcadas para 1965, e JK era o grande favorito.
O general Castello Branco assumiu com ele o compromisso de colocar imediatamente o país nos trilhos da democracia.
Pediu e obteve os votos do PSD para se eleger presidente pelo Congresso. Mas o movimento militar se radicalizou, e JK teve seu mandato de senador cassado e seus direitos políticos suspensos.

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