São Paulo, domingo, 12 de janeiro de 1997
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O mínimo no futebol já é conquista história

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Dizem que foi uma festa à americana, no Gallery da Mooca, o Moinho Santo Antônio. Até mesmo o bichinho símbolo do Paulista é mezzo a mezzo -um tanto caboclo, um tanto importado (confesso que só vi esquilo em cartuns da Disney).
Mas vá lá. Melhor que tenha sido um lançamento animado, colorido, pra cima, como se dizia nos 60, do que aquele formalismo de tergal que costuma revestir tais eventos.
Assim como aproveitarei para abrir aquele Chablis achampanhado que está mofando na geladeira, caso a FPF cumpra a promessa de limpar os banheiros dos estádios e oferecer um gramado decente.
Não é nada, não é nada, teremos dado um salto gigantesco para a civilização. Diria que atingiremos, nesse passo, a segunda metade do século 20.
Sim, porque conseguir o mínimo, o óbvio, o elementar, no futebol, para nós, representa uma conquista histórica: banheiros asseados e um campo de jogo onde a bola rola, meu Deus, nem acredito!
Ah, mas há também todo um conjunto de acessórios à disposição do torcedor que for aos estádios: junto com o ingresso comprado antecipado, um kit alimentar, almofadinhas para amansar os bumbuns sofridos nas duras cadeiras de plástico, quando não no cimento cru.
Além, claro, da exposição dos bumbuns das estonteantes gatinhas que comporão o time de refrigério nos instantes em que a bola estiver parada.
Ironias à parte, pelo menos é uma demonstração de que a FPF começa a enfrentar o problema do êxodo em massa dos estádios de futebol.
É fundamental, mesmo, cercar o torcedor, visto como consumidor, de todo carinho possível, pois, até aqui, ele tem sido tratado como um marginal. Mesmo porque o que restou de frequentadores, com as tais torcidas uniformizadas, pouco se diferenciava desse perfil.
Mas como a FPF chegou a isso? Via contratação de uma empresa de marketing. Isto é: transferindo para profissionais do ramo a tarefa de elaborar essas medidas.
Resta fazer o mesmo no que toca ao futebol propriamente dito. Ou seja: o chantilly está cremoso, alvo e consistente; a cereja, um rubi; e o recheio?
O recheio, o produto mesmo, que é o jogo em si e as regras que vão determinar seu desenvolvimento, esse padece do mesmo equívoco crônico de todos os anteriores bolados pelos cartolas: duas chaves, dois turnos e, no final, um quadrangular com os dois primeiros de cada grupo.
Ora, ora, ora. Mais uma vez vai-se concentrar todo o interesse do torneio na sua fase final, disputada sob um critério técnico injusto, posto que iguala-se o desigual.
E esse é que é o buraco negro de todos os regulamentos feitos pelos cartolas: ao invés de ser pra cima, como a festa de lançamento, é pra baixo.
É a síndrome da repescagem, aquele anzol artificial que os cartolas instalam em todas as fórmulas de disputas, para puxar o que está embaixo, quando a lei do jogo manda valorizar o que está em cima.
É o anzol que, no lugar de pescar o torcedor, perfura a carótida de sua expectativa.
*
Um terno abraço no Zico, pelo irmão Antunes.

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