São Paulo, segunda-feira, 13 de janeiro de 1997
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O moribundo e a reeleição

VALDO CRUZ

Brasília - O moribundo recebe a visita do padre da cidade para a extrema-unção. O sacerdote começa seu ritual e pede ao doente terminal que repita algumas louvações.
"Viva Jesus Cristo", foi a primeira delas. O moribundo seguiu a ordem e repetiu: viva Jesus Cristo.
O religioso prosseguiu citando uma infinidade de santos e santas. Viva a Virgem Maria, viva são João Batista, viva santa Luzia, viva são Judas Tadeu, viva são Pedro.
O doente, prostrado na cama, repetia todas as frases. Até que o sacerdote, por último, ordenou: "Morte ao satanás". Seguiu-se um silêncio.
O padre insistiu: "Morte ao satanás, meu filho". Não se ouviu um pio. Uma terceira tentativa do religioso e o doente, enfim, pergunta se era indispensável repetir a última frase.
O sacerdote acenou positivamente, já demonstrando um pouco de irritação. Para surpresa do padre, o moribundo pediu desculpas e disse que infelizmente não poderia repetir aquela última ordem.
E justificou-se: "Pra que mexer com quem está quieto e não está mexendo comigo? Sabe lá se o meu destino é ir para o lado dele".
O caso foi contado por um deputado para exemplificar a posição de muitos colegas sobre a reeleição. Aqueles que se dizem indecisos e estão conversando com os dois lados, aguardando o melhor momento para se decidirem.
Enquanto isso, nada de sair criticando nem o presidente Fernando Henrique Cardoso nem o ex-prefeito Paulo Maluf. Pelo contrário, a estratégia é ficar bem com os dois grupos.
Até que venha a melhor oferta. Aí, com certeza, o deputado-moribundo vai dizer "viva FHC" ou "viva Maluf". Do jeito que a turma governista anda operando, os indecisos acabarão optando pelo reino tucano.
Uma coisa é certa. Morte a FHC ou morte a Maluf ninguém vai dizer. Com raríssimas exceções, político é aquele tipo que não gosta de fechar porta nem do céu nem do inferno. Um dia ele pode ser obrigado a bater numa delas.

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