São Paulo, quinta-feira, 16 de janeiro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Crise tem como eixo palanques de 98

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

O eixo da crise entre o PMDB e o presidente Fernando Henrique Cardoso passa, acima de tudo, pela montagem dos palanques para a eleição de 1998, tanto a presidencial como a de governadores.
A avaliação que se faz no PMDB, seja entre os governistas como entre os oposicionistas do partido, é a de que, se a reeleição for entregue a FHC pelo PFL, os caciques regionais do PMDB "não terão como conduzir a montagem dos palanques para 98", como diz o deputado federal Aloysio Nunes Ferreira Filho (PMDB-SP).
O líder do partido no Senado, Jader Barbalho (PA), confirma a tese, construindo uma espécie de teorema político:
"Se a reeleição for entregue ao presidente pelo PFL, saem fortalecidos o PSDB e o PFL, que foram os partidos que elegeram FHC e se tornarão donos da nova candidatura do presidente", começa Jader.
E completa: "E a nós, do PMDB, o que nos restará de espaço de poder político?".
A resposta dos sonhos dos peemedebistas é esta: a presidência das duas Casas do Congresso (Câmara e Senado), antes da votação da reeleição.
Com isso, impede-se que seja o clã Magalhães o condutor da reeleição, já que, no cronograma original, ela seria aprovada, na Câmara, sob a presidência de Luís Eduardo, e, no Senado, sob o comando de seu pai, Antonio Carlos.
Foi exatamente esse arranjo que acendeu o estopim da crise PMDB/FHC.
Os líderes do PMDB governista negociavam, domingo, durante a convenção, o cronograma de votação da emenda mais as presidências das duas Casas.
No plenário, Paes de Andrade (CE), presidente nacional do partido, passara o comando da convenção para o único "quercista" dos deputados federais do PMDB paulista, Marcelo Barbieri.
Irritação inédita
"Traição", gritou Fernando Henrique Cardoso, ao saber da notícia.
O presidente do PMDB, Paes de Andrade, havia estado no Palácio da Alvorada, dias antes, para garantir a FHC que esse tipo de moção não seria aprovada.
Mas o senador Carlos Bezerra (PMDB-MT) já havia alertado assessores do presidente, em jantar no sábado, no restaurante Piantella, tradicional reduto peemedebista de Brasília, de que havia o risco de a moção passar.
A moção não foi o único episódio a provocar em FHC uma irritação que até amigos de muitos anos juram jamais ter visto igual.
Houve também os xingamentos, comandados basicamente pelo MR-8, ex-grupo armado, hoje tropa de choque do quercismo. Houve vaias até para uma mensagem de FHC ao partido, elogiando-o.
"O presidente sentiu-se obrigado a reafirmar a sua autoridade política", ouviu a Folha junto ao Palácio do Planalto.
A forma de fazê-lo, no entanto, causou ondas de choque entre todos os peemedebistas, aliados do presidente ou seus opositores.
Causou estranheza, acima de tudo, pela agressividade, raríssima no presidente.
Quem conhece FHC há muito tempo garante que é seu hábito, em momentos que considera muito sérios, escrever o que quer dizer.
Foi o que ele fez, ao redigir a nota que leria depois aos 15 líderes do PMDB que convocou ao Planalto, na tarde de segunda-feira.
Mas até antigos companheiros de Senado, como Pedro Simon (PMDB-RS), duvidam que FHC tenha sido o autor do texto que leu.
"Todo o mundo tem certeza de que não foi ele quem escreveu aquilo. Ele nunca fez algo parecido em toda a sua vida", diz.
Um dos presentes, o presidente do Congresso, José Sarney (PMDB-AP), disse algo parecido ao próprio FHC. Chamou-o a um canto para dizer: "O personagem que você representou hoje não é você".
A ironia de jader
Jader Barbalho, outro dos presentes, ficou igualmente chocado. "Se eu não fosse o líder do partido, teria me levantado imediatamente após a leitura da nota e ido embora", contou à Folha.
Ele chegou a ser irônico com FHC. Lembrou que o presidente deveria saber muito bem que o PMDB era uma grande frente e espetou: "Não é como certos partidos em que um líder não aparece num jantar e o jantar não vale."
É alusão ao episódio em que Antonio Carlos Magalhães reagiu a um jantar de líderes do PFL, no qual se vetou o ingresso no partido do senador Gilberto Miranda (então do PMDB-AM), com a frase: "Jantar a que não vou, não vale".
Simon, que não estava presente, preserva até agora a indignação e faz uma pergunta inquietante:
"Se o presidente do Congresso se chamasse Antonio Carlos Magalhães, você pode imaginar o que teria acontecido naquela sala?".
ACM, se eleito presidente do Senado, vai ser por extensão presidente do Congresso. Ou, como prefere jader Barbalho, "fica dono de FHC de uma vez".

Texto Anterior: Deputados vão apressar Orçamento
Próximo Texto: Partido decide adiar votação da emenda
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.