São Paulo, quinta-feira, 23 de janeiro de 1997
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Petróleo, globalização, dinossauros e lagartixas

ALOYSIO BIONDI

Tá bom. Então, vamos fazer de conta que a tal globalização é inevitável porque "o mundo mudou", como dizem a equipe FHC e seus acólitos.
Mesmo que se aceite essa tese, é evidente que qualquer país deve discutir o caminho que lhe traga as maiores vantagens possíveis -ou que lhe evite ao máximo os possíveis prejuízos.
Privatização, quebra de monopólio, escancaramento às importações, destruição de empresas e empregos -tudo isso deve ser colocado na mesa e confrontado com alternativas.
Ao entrar no jogo da globalização, cada país deve avaliar seu "cacife", ceder somente o inevitável e exigir contrapartida dos países ricos.
O Brasil não está fazendo nada disso. Está sendo "depenado". A sociedade não reage, graças à "lavagem cerebral" detonada nos últimos anos com o uso de argumentos mentirosos espalhados pelos "lagartixas", na expressão da professora Maria da Conceição Tavares (a propósito, quem nasceu pra ser lagartixa jamais virá a ser um dinossauro).
Até há poucos anos, dizia-se que o Brasil e outros países menos desenvolvidos teriam imensa prosperidade, se agigantariam no futuro, graças a seus recursos naturais: minério, petróleo, terras para plantar, população (mercado consumidor) -e até sol, isto é, energia solar.
Agora, com a pretensa onda de "modernidade, porque "o mundo mudou", os lagartixas repetem que essas vantagens não têm mais a mínima importância.
Hoje, insistem, o que conta é o domínio de tecnologia e, por isso -concluem-, é preciso escancarar os mercados e entregar-se nos braços das multinacionais dos países ricos, os campeões na área. Tudo mito. Raciocínio falso.
O petróleo Curto e grosso: na prática, os EUA e outros países ricos (à exceção da Inglaterra) não têm petróleo.
Como assim? Para atender ao consumo norte-americano, os campos petrolíferos do país se esgotariam em cinco anos. C-i-n-c-o anos. Por isso, EUA e outros países ricos precisam do petróleo dos países pobres. Importam petróleo. Dependem.
Sem energia Acontece que, além de não ter petróleo, esses países também têm pouquíssimos rios onde seja possível construir usinas para gerar energia elétrica.
Resultado: a energia é gerada em usinas movidas a petróleo e gás (secundariamente, também carvão). Pouca gente entendeu até hoje que o petróleo é essencial para a economia mundial não por ser usado como combustível para carros. Mas porque ele gera praticamente toda a energia que os países ricos usam.
Os países ricos são gigantes com pés de barro. Sem petróleo, não têm energia elétrica. Sem energia, isto é, sem petróleo, a economia dos EUA e outros países ricos pára. Entra em colapso. Total.
Nova invasão Por isso, ao longo de décadas (ou séculos) os países ricos invadiram os países pobres, derrubaram governos, sugaram "colônias".
Hoje, estão usando métodos mais sutis. Inventaram essa história de modernidade e "neoliberalismo" para dominar governos e lançar operações de lavagem cerebral na opinião pública de países como o Brasil.
Pés de barro É absolutamente falso, portanto, que "no mundo moderno" os recursos naturais, os minérios (que os países ricos também não têm), o petróleo, os rios aproveitáveis não tenham mais importância- e que os países pobres devem entregá-los aos ricos.
Com toda a sua tecnologia, os países ricos simplesmente param de funcionar -sem os recursos naturais dos países pobres. Esse é o "cacife" do Brasil e de outros países pobres que deveria estar sendo usado no jogo da globalização. O Brasil poderia impor condições, escolher o que lhe convém, barganhar no bom sentido. A equipe FHC colocou o país de quatro diante dos colonizadores.
Tecnologia Por limitação de espaço, apenas uma consideração sobre o "avanço tecnológico".
Estudos de organizações mundiais mostram que quem realmente cria tecnologia, inova, revoluciona não são as grandes multinacionais. E sim microempresas. "Inventores". É burrice escancarar o mercado para as múltis. O caminho é dar apoio à criação de tecnologia local.

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