São Paulo, domingo, 26 de janeiro de 1997
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Gordo, mas feliz

NINA HORTA

A história que minha mãe me contou foi a de uma moça complexada pela magreza, feia, discriminada, cheia de problemas com o corpo. De quando em quando ia para a cama por dias a fio, sem poder levantar, num regime de superalimentação para engordar. Comia tantos mingaus cremosos, massas e ovos que ficava verde, enjoada, vomitava e emagrecia ainda mais.
O vestido de noiva teve de ser recheado com babados internos para simular barriga e bumbum. Pelas fotos era uma Hepburn na hora errada.
No espaço de 60 anos, o pêndulo da moda foi de um extremo ao outro. De lá para cá, só fizemos engordar e sonhar com corpos esbeltos. Faz um bom tempinho que o nosso ideal de beleza é "quanto mais magro melhor" e que nosso corpinho está mais gordo. Quando é que o desejo vai empatar com a realidade? A corda está tensa, esgarçada, com certeza vai estourar, mas não de um dia para o outro, ou até, quem sabe? Ser gordo é fácil, o difícil é mudar o padrão e achar a gordura bonita, dizem os estudiosos do assunto.
Quando vamos tomar consciência de que a idéia obsessiva de magreza é um mito, uma tendência fabricada, inventada, promovida, exploradora e opressora? Que nunca seremos tão magros quanto a moda quer? Chegou a hora de fazer panelaço, pintar a cara, botar a bunda na rua. Na frente, liderando a revolução, Rubens, Renoir, Botero, Freud, Liz Taylor, Marlon Brando, Pavarotti, Tim Maia, Poppovic, Jô Soares (mulheres, só duas! Aí tem coisa!) e nós todos, livres da prisão de um corpo apertado demais, sambando, felicíssimos.

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