São Paulo, segunda-feira, 27 de janeiro de 1997
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Seguros, os números de 96 não foram tão bons

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Existem quatro números que precisam ser verificados quando da análise do balanço de uma seguradora. São eles o resultado industrial, o resultado operacional, o resultado patrimonial e o resultado final.
Eles são importantes porque mostram cada etapa das operações da companhia, apontando onde ela está ganhando dinheiro e se realmente é uma empresa eficiente, ou simplesmente está se valendo do dinheiro dos acionistas para mostrar um lucro que, em verdade, é artificial e simplesmente camufla um prejuízo.
Ao contrário da atividade industrial comum, o risco da atividade seguradora começa onde o das outras termina. Enquanto uma fábrica de automóveis encerra o ciclo de produção no instante em que vende o seu produto, a operação de seguro começa pelo fim, ou seja, a responsabilidade da companhia de seguros (que equivale ao ciclo de produção da montadora de automóveis) começa no momento em que ela vende a sua apólice.
De acordo com a legislação brasileira, as apólices de seguros normais têm um prazo de vigência de um ano, sendo que o prêmio deve ser pago antecipadamente para que o segurado tenha direito à indenização. Assim, uma empresa de seguros fatura na frente para arcar com a parte mais pesada de seus custos depois, e esta depois se estende por todo um ano, durante o qual ela não vai receber nenhum centavo a mais do que já lhe foi pago, à vista ou parcelado.
Em função disso, a Susep (Superintendência de Seguros Privados), que é a autarquia encarregada da fiscalização da atividade seguradora brasileira, exige que as companhias de seguros difiram (adiem) os seus prêmios, lançando-os parcelados em 12 meses, equivalentes ao prazo de vigência das apólices.
Todavia o que acontece na prática, especialmente na carteira de seguros de automóveis, é que os prêmios não são pagos em 12 vezes, mas em quatro, o que faz com que a seguradora tenha em caixa uma massa de dinheiro muito grande, muito antes do fim do risco.
Se esse dinheiro não for gerenciado com cuidado, ou melhor, se a companhia não for gerenciada com cuidado, seus administradores podem ter uma idéia errada sobre a sua rentabilidade, confundindo o dinheiro em caixa com lucro, porque o prêmio já foi recebido e os sinistros ainda estão ocorrendo ou não ocorreram.
É por isso que apenas a análise do resultado operacional ou do resultado final de uma seguradora pode dar uma idéia errada sobre o seu desempenho, transmitindo a impressão de que ela tem uma boa aceitação de riscos, ou de que é rentável, quando na verdade ela está se valendo das aplicações financeiras para mascarar os seus resultados.
O resultado industrial mostra como a seguradora está no seu negócio direto. É o resultado industrial que permite aferir se a seguradora está ou não ganhando dinheiro apenas com a venda de suas apólices. Ele desconsidera o resultado das aplicações dos prêmios recebidos pela venda dos seguros, limitando-se a mostrar a diferença entre o faturamento e as despesas da companhia.
Uma seguradora com resultado industrial positivo é quase que com certeza uma empresa altamente rentável. Lamentavelmente, a maioria das seguradoras em operação no Brasil, ao longo de 1996, não teve um resultado industrial positivo.
O resultado operacional acresce ao resultado industrial os ganhos com as aplicações financeiras do dinheiro recebido pela venda dos seguros. Quer dizer, ele melhora o desempenho industrial, agregando à atividade-fim da companhia a remuneração direta consequente da aplicação do dinheiro dos prêmios.
Todavia, com a estabilização da moeda, essa remuneração não tem sido suficiente para compensar os prejuízos industriais, fazendo com que o resultado operacional continue no vermelho. E, ao que consta, esse é o cenário de boa parte dos balanços de 96.
O resultado patrimonial é o salvador da pátria. Ele reflete o resultado das aplicações do patrimônio da companhia, ou seja, é a consequência direta do dinheiro investido pelos acionistas e não deveria em hipótese alguma subsidiar as operações de seguro, porque, ao fazer isso, a seguradora está tirando dinheiro bom de seus donos, que deixam de receber dividendos para pagar a má aceitação de riscos da empresa.
E esse será o quadro de um número alto de balanços de seguradoras referentes a 1996. Várias delas estão se apossando de parte do resultado patrimonial para fechar os seus números no azul, dando um lucro que é ilusório.
Em bom português, ao publicar seus balanços com o lucro gerado apenas pelo resultado patrimonial, elas, em realidade, estão diminuindo de tamanho, porque estão se descapitalizando, o que, a médio prazo, é ruim, na medida que parte delas já está descapitalizada em função do crescimento vertiginoso do setor ao longo dos anos de 94 e 95, que exigiu um forte aumento das reservas técnicas para fazer frente aos novos riscos.

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