São Paulo, domingo, 19 de outubro de 1997
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Jari acumula prejuízos e pode parar de vez

LUIZ CINTRA
DA REPORTAGEM LOCAL

As próximas semanas serão decisivas para a sobrevivência da Jari Celulose S/A, que, aos 30 anos, pode parar definitivamente, caso não haja acordo na renegociação da dívida de R$ 320 milhões da empresa junto a um grupo de 19 bancos.
A situação delicada que a Jari atravessa -desde a sua fundação, em 1967, registrou lucro uma única vez, em 1994- pode significar o fim das atividades da empresa, parada desde o final de maio, quando um incêndio atingiu o gerador de energia da empresa e a sala de controle da fábrica de celulose.
Caso não haja acordo na renegociação da dívida, será o fim de um projeto idealizado pelo empresário norte-americano Daniel K. Ludwig, que nos anos 60, então um dos homens mais ricos do mundo, gastou algo em torno de US$ 1 bilhão em uma área de 1,6 milhão de hectares, tamanho próximo ao do Estado de Sergipe.
O objetivo de Ludwig era construir no meio da selva amazônica, em uma região praticamente despovoada na fronteira entre o Pará e o Amapá, o que deveria ser a garantia de boa parcela do abastecimento mundial de celulose e de alimentos, começando pelo cultivo de arroz, no final do século 20.
Mas o destino do projeto foi uma outra história, bem mais complexa e até hoje sem a perspectiva de um final de sucesso.
Somente no ano passado o prejuízo acumulado foi de R$ 133,6 milhões; no primeiro semestre deste ano, de R$ 62 milhões.
Com o acidente de maio, a Jari Celulose recebeu R$ 17 milhões a título de indenização e um prêmio mensal de R$ 6,5 milhões para cobrir seus custos fixos.
Esse prêmio mensal, no entanto, deixará de ser pago assim que as obras de reparo estiverem concluídas, o que deve ocorrer no início de novembro, de acordo com o diretor-presidente da Jari Celulose, Britaldo Soares.
É justamente aí que a situação da empresa complica-se de vez. Sem capital de giro para retomar suas atividades, já que as vendas não estão ocorrendo, a empresa pode ficar sem recursos inclusive para pagar seus 1.600 funcionários.
O executivo da Jari prefere ser cauteloso ao falar sobre esse ponto, mas não esconde a preocupação com o ritmo das negociações.
"Estamos caminhando para evitar um trauma maior na Jari e o empenho de todos é dar a melhor solução possível. Os envolvidos nas negociações estão cientes do fator tempo", diz o executivo.
Britaldo Soares estima que serão necessários R$ 46 milhões para reiniciar as atividades da Jari, dinheiro que dificilmente virá dos controladores da empresa, os irmãos Guilherme e Mario Frering, que desde o início do ano deixaram de injetar recursos próprios na empresa.
A última dose foi no final do ano passado, na forma de um empréstimo de R$ 30 milhões, recursos provenientes da venda da indústria Amcel para a multinacional norte-americana Champion.
Os irmãos Frering, netos do fundador do grupo de mineração Caemi, Augusto Trajano de Azevedo Antunes, tentam atualmente buscar uma solução definitiva para a Jari Celulose.
Solução essa que passa necessariamente por um acordo com o BNDES, que, além de ser credor de R$ 75 milhões, é sócio da empresa, com 20% do capital total (o Banco do Brasil detém outros 12,5% do capital e créditos a receber de R$ 40 milhões.)
A presença do BNDES é decisiva, já que para a viabilidade econômica do projeto será preciso investir pelo menos outros R$ 90 milhões, além dos R$ 46 milhões necessários para o reinício das operações.
Eduardo Rath Fingerl, diretor do BNDES responsável pelo caso Jari, diz que começa a ver "uma luz no do fim do túnel" para a solução dos problemas da empresa. Mas ele é o primeiro a admitir a complexidade do caso.
"A solução depende de vários fatores, inclusive porque envolve governo federal, Estados, municípios, controladores e credores, como o BNDES e o Banco do Brasil", diz Rath Fingerl.
Ou seja, a crise da empresa é também um problema político, já que cerca de 50 mil pessoas vivem na região e certamente serão prejudicadas se o projeto acabar.
No distrito de Monte Dourado, por exemplo, a Jari é encarregada de distribuir energia elétrica a uma população de 12 mil pessoas, o que é feito gratuitamente.
À procura de sócios
Eduardo Rath Fingerl, do BNDES, confirma que uma das soluções em estudo é a entrada de um sócio estrangeiro. Nesse caso, a norte-americana Trillium seria forte candidata.
Mas, segundo a Folha apurou, a Trillium estaria interessada apenas nas reservas de eucalipto da Jari e não na produção de celulose, usando para tanto sua experiência no manejo florestal.
Além da Trillium, uma empresa de capital brasileiro também poderia entrar como parceira.
Rath Fingerl confirma também que outra possibilidade é a transformação dos bancos credores em sócios do empreendimento.
O ponto agora, diz o diretor do BNDES, é concluir a engenharia financeira necessária para a retomada das atividades da empresa.
Em seguida é necessária uma reorganização societária da Jari Celulose S/A.
Britaldo Soares, diretor-presidente da Jari, informa que os irmãos Frering já se manifestaram a respeito e estão dispostos a abrir mão do controle acionário. O que o BNDES busca agora é encontrar um interessado em assumi-la.

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