São Paulo, domingo, 19 de outubro de 1997 |
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Privatização de escolas fracassa nos EUA
DILVO I. RISTOFF
Exceto por incursões marginais no setor de serviços das universidades, as iniciativas de privatização tiveram melhor receptividade na educação básica, em que, no início dos anos 90, o ensino propriamente dito, em alguns casos, foi entregue a empresas com fins declaradamente lucrativos. Mesmo na educação básica, no entanto, tiveram pouco sucesso. O caso mais notável aconteceu em 1994. Na época, o ex-vendedor de copiadoras John Golle fez história ao tornar a sua empresa, a Education Alternatives Inc. (EAI), responsável por todas as 32 escolas públicas da cidade de Hartford, Connecticut. Ao constatar que abrir escolas não era tão lucrativo quanto pensara, Golle começou a negociar contratos para administrar escolas municipais. Sua mensagem? "Nós podemos ensinar melhor... e podemos todos lucrar com isto." Conseguiu o primeiro contrato em Dade County, Flórida, o segundo em Baltimore, Maryland, e, por último, o contrato milionário de Hartford. O processo privatizante, via "franchising", parecia deslanchado nacionalmente. As ações da empresa, à venda por US$ 4 em 1991, saltaram para US$ 49 em 1993. Com as críticas que começaram a surgir ao seu desempenho, já em 1994 o preço da ação caiu para menos de US$ 10, indicando que, nos negócios da educação, o preço da ação nem sempre reflete o seu valor. Desde então, a EAI tem acumulado fracassos: gastos com a educação em Baltimore, por exemplo, ao invés de diminuir, aumentaram em 20%; os índices de evasão cresceram; o desempenho dos alunos nos testes padronizados piorou; o atendimento a alunos com necessidades especiais ficou seriamente prejudicado; e os investimentos de capital foram três vezes menores que os prometidos. Os resultados, portanto, ridicularizam as duas principais promessas da experiência privatizante: melhorar a qualidade do ensino e diminuir os seus custos. Não é por acaso que o setor público começa a retomar o comando também destas escolas. Dade County encerrou seu contrato com a EAI em 95, com o argumento de que não houve melhoras que justificassem a sua continuação; Baltimore fez o mesmo em 96, um ano e três meses antes do término do contrato; a Hartford rescindiu o contrato, também em 96, em meio a uma ruidosa batalha judicial. Apesar da proliferação de grupos da educação pelo lucro (há hoje pelo menos uma dúzia de grandes empresas disputando o mercado com a EAI), a verdade é que nos EUA a privatização é pouco significativa. Não bastassem as repetidas declarações do presidente Clinton no sentido de considerar a educação questão de segurança nacional e seu empenho pessoal em garantir a universalização do acesso e a virtual gratuidade no ensino superior público, estudos recentes de Carol Asher, George Kaplan e outros mostram que, ao contrário do Brasil, os EUA aceitam experimentar, mas estão longe de entregar tão importante função à iniciativa privada, seja no nível básico ou universitário. Enquanto os EUA procuram aprender com essas experiências de laboratório, o Brasil acelera perigosamente o processo, com o sinal já amarelo. É preciso frear esta tendência brasileira. Nossas instituições públicas têm, sem dúvidas, as suas ineficiências, e o bom senso diz que é preciso corrigi-las. Antes, no entanto, há que se reconhecer os seus valores humanos e a sua importante e, talvez, inalienável, função social. Texto Anterior: Universidade pública sem retoques Próximo Texto: Uma premiação contestada Índice |
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