São Paulo, segunda-feira, 20 de outubro de 1997
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O apocalipse segundo Araújo

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Antônio Araújo fez "O Livro de Jó" e sumiu. Passou um ano em Nova York, entre o decadentismo de Bob Wilson e o otimismo étnico de George Wolfe, para voltar duas semanas atrás com uma idéia na cabeça: o apocalipse.
O milênio está aí, o Rainbow Room de Nova York está todo reservado (há 25 anos) para a noite de 31 de dezembro de 1999 e o diretor brasileiro vai falar do fim dos tempos, ou do início.
Vai partir do Apocalipse de São João, que fecha a Bíblia, como antes falou do paraíso e dos questionamentos de Jó. Início, meio e fim do Livro Sagrado, numa trilogia ou trindade santíssima.
Mas não quer "a coisa pesada, de destruição", como diz. Estava até em dúvida sobre o tema.
"Mas a gente está aí num momento de repensar coisas. O final do milênio provoca isso, esses revisionismos históricos. E o que vem aí... Isso me interessa mais do que fazer um espetáculo de imagens de destruição. Me interessa a idéia de julgamento."
Mas, com o apocalipse bíblico na mão e seu acúmulo histórico de imagens dos quatro cavaleiros, da morte, pode ser inevitável. "Talvez não consiga escapar disso (ri). Mas as duas coisas estarão presentes. Também a crença de que algo vai se transformar."
Para tanto, para não se limitar à destruição, o Apocalipse não vai ser a única fonte da montagem, a qual, aliás, vai ganhar texto novo. Como antes, com "Jó", a razão deve entrar pelo meio da história, e aqui através de alguns de seus mais dignos representantes.
Como Isaac Newton. O físico mergulhou nas relações entre profecia, história e o fim do mundo e foi tão científico nos seus cálculos sobre o tema, como registra o livro "O Tempo na História", quanto nas contribuições para a física matemática e a astronomia.
"Ele faz uma análise, busca entender um texto profético difícil", diz o diretor, lembrando as "Observações sobre as Profecias de Daniel e o Apocalipse de São João". Também Leonardo Da Vinci esforçou-se cientificamente sobre os escritos proféticos.
"Você pega Leonardo Da Vinci, Newton, enfim, o cientista, e como ele entra em contato com a espiritualidade." Mas também pega outros textos, nada científicos, como as mencionadas profecias de Daniel e até os apocalipses apócrifos, banidos da Bíblia cristã.
Antônio Araújo voltou com pouco mais do que a idéia na cabeça, para o seu "Apocalipse de São João", título provisório. Não sabe quem vai escrever -o que deve acontecer nos moldes de "Paraíso Perdido" e "Jó", que os autores Sérgio de Carvalho e Luís Alberto de Abreu escreveram junto aos ensaios e às improvisações da companhia, Teatro da Vertigem.
Talvez até mais. "Eu quero o dramaturgo mais próximo, dentro da sala de ensaio. E eu quero que o texto tenha uma radicalidade", diz o diretor. "Eu sinto uma poesia descarnada no texto."
Para esta fase inicial, de elaboração do texto, já tem garantidos R$ 55 mil brutos do prêmio Flavio Rangel, da Funarte. Para a montagem, o elenco não deve ser muito diverso daquele de "Jó". A estréia não tem data definida.

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