São Paulo, segunda-feira, 27 de outubro de 1997 |
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Filme traz o drama das mulheres na Bósnia
MARILENE FELINTO
Algumas dessas mulheres contam sua história em "Chamando os Fantasmas". Por meio de depoimentos marcados por cortes abruptos, entrevistas e fotografias de cena, o documentário recompõe a passagem de Jadranka Cigelj e Nusreta Sivac pelo campo de concentração de Omarska, na Bósnia-Herzegovina. Amigas de infância, de etnia muçulmana e ambas profissionais da área de direito, Jadranka e Nusreta experimentaram juntas o horror do processo de "limpeza étnica" imposto pelo sérvios. Elas foram as primeiras mulheres a aceitar falar para Mandy Jacobson e Karmen Jelincic, idealizadoras do filme e diretoras estreantes. Questão de justiça "Para elas, falar foi uma maneira de começar a canalizar para o trabalho o que antes era dor, ódio e desejo de vingança, transformando tudo em uma questão mais profunda de justiça", diz Mandy Jacobson. Parte do objetivo do documentário, que era incluir o estupro na categoria dos crimes de guerra, já foi atingida, com a recente chancela do Tribunal Internacional de Crimes de Guerra da ONU. O segundo objetivo, que é identificar os estupradores, denunciá-los e levá-los a julgamento nos tribunais internacionais, só se realizou em parte. Os criminosos estão todos identificados e acusados de crimes contra a humanidade, mas vivem em liberdade, protegidos pela República da Sérvia. Vítimas de guerra Tudo muito tocante, tudo muito politicamente correto nesse documentário que, em 1996, ganhou o primeiro prêmio do festival de cinema da Human Rights Watch, organização norte-americana de defesa dos direitos humanos. O que se discute é se mulheres estupradas numa guerra não seriam apenas "vítimas de guerra" como quaisquer outras, como crianças e homens. No próprio filme de Jacobson e Jelincic, cheio de imagens de prisioneiros croatas e muçulmanos definhando nos campos sérvios, fica claro que os homens sofreram os mesmos horrores (e outros tantos) que as mulheres. Se também eles foram torturados e estuprados, por que um documentário que trata apenas da violência contra as mulheres? Porque mulher, por natureza, não estupra. E porque mulher, por condição cultural, ainda não faz a guerra, ainda não tem o poder de permitir ou de ordenar estupros. Talvez só por isso. Texto Anterior: "Estereótipo" desvenda Eslovênia pop Próximo Texto: Mostra anuncia 12 finalistas para prêmio a novos diretores Índice |
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