São Paulo, domingo, 9 de novembro de 1997
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A a Z do calouro

Para ajudar milhares de vestibulandos que entram agora na etapa mais "hard" da competição por uma vaga na universidade, a Revista da Folha compilou um pequeno dicionário respondendo às principais dúvidas que aparecem nessa época. Para isso, ouviu coordenadores de cursinhos, reitores, pedagogos, psicólogos e... muitos alunos.

Ansiedade: é possível controlá-la nessa época do ano, de véspera de vestibular? Excesso de estudo pode chegar a atrapalhar?
A ansiedade nesse período pré-vestibular é inevitável. O importante é descobrir se ela é "imobilizante" ou "produtiva". Se a ansiedade impede o adolescente de exercer suas atividades, o primeiro passo é procurar formas para relaxar. É preciso dosar horas de estudo com outras atividades, não esquecendo de sair com amigos e praticar algum esporte. Se nem assim consegue-se obter calma, o melhor é procurar um psicólogo para uma orientação.

Bicho: como passar pelos trotes? Adianta resistir ou o melhor é ceder às "brincadeiras" dos veteranos? Por que eles não acabam?
Ainda existe trote em várias faculdades, apesar da mobilização crescente para acabar com ele. "O trote violento é incompatível com a vocação de médico. O calouro deveria ser recebido com festas e brincadeiras, não com violência", diz Irany Novah Moraes, professor da Faculdade de Medicina da USP e ex-presidente da Academia de Medicina de São Paulo, que lançou este mês uma "Campanha de Profilaxia do Trote".
Segundo Moraes, as academias de educação e de psicologia são as próximas a aderir à campanha. "Faremos um reforço de conscientização no início do ano. É impossível ensinar cidadania se o trote continuar", afirma.
Fernando Amorim Lavieri, do centro acadêmico do curso de direito da PUC-SP, diz que "o bicho tem que saber que o trote é uma brincadeira: se ele não quiser, não precisa brincar". E dá uma dica: "Não venha muito mal-humorado, porque você certamente será alvo. Também não venha achando que tudo é festa, senão você acaba ficando com fama de palhaço. O meio termo é a melhor opção".
Lavieri aconselha os bichos a aproveitarem "para beber muita cerveja". "Se você não fizer isso no primeiro ano, é provável que não dê para beber nos anos seguintes."
O aluno da Poli-USP Nelson Ferreira, 20, acha que que as brincadeiras violentas são "pura ignorância" e que só perduram porque o bicho, veterano no ano seguinte, resolve "se vingar" e repetem o ciclo.

Curso: como escolher a melhor opção? Testes vocacionais ajudam? O que é preciso considerar na hora de decidir que profissão seguir?
Em primeiro lugar, tenha em mente que nenhuma escolha é definitiva. "Podemos nos dar bem em diversas áreas e profissões", diz a psicóloga Rosely Sayão. Para ela, o teste vocacional tradicional -uma bateria de exames que tenta medir e identificar inteligência, interesse e aptidão- não funciona. "Quem é inteligente acaba manipulando os resultados", afirma.
Na sua opinião, o melhor tipo de orientação vocacional é a conduzida com discussões e pesquisa em grupo, onde os jovens, por um período maior de tempo, "têm condições de saber mais e decidir melhor".
Para Sílvio Bock, diretor do Nace - Orientação Vocacional e Redação, os testes são frágeis. "Sou contra o pressuposto de que, como um raio X, o teste vai descobrir em você algo que ninguém sabia."
O primeiro passo para escolher um curso, segundo Bock, é pensar na profissão que você gostaria de exercer. O ideal é repensar sua própria história, tentar conhecer as profissões o máximo possível -por meio de todos os caminhos disponíveis (Internet, conversas com profissionais, palestras, imprensa, etc)-, avaliar o contexto em que se vive e imaginar que mudanças gostaria de operar, em si próprio e no mundo. "Escolher significa um profundo ato de coragem e não há uma receita", diz Bock.

Diploma: é essencial hoje na hora de conseguir um emprego? Além do 3º grau, o que mais o mercado exige?
O diploma de uma faculdade considerada de 'primeira linha' faz diferença na hora de concorrer por um emprego. Segundo Sylmara Valentini, consultora da Manager, "às vezes o profissional que saiu de uma faculdade menos renomada é até melhor, mas ele nem chega a ir para a entrevista". Sylmara afirma que, com a competitividade crescente do mercado, "daqui a pouco, quem não tem um outro idioma fluente e pós-graduação ficará fora da concorrência".

Estágio: qual é a importância e qual a melhor maneira de encontrar um? Em que ano o aluno deve começar a trabalhar?
Fazer estágio é a primeira oportunidade de o aluno lidar na prática com o conhecimento que está adquirindo no curso. Procure o Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), que semanalmente, o centro oferece cursos (grátis) para facilitar a inserção dos estudantes no mercado. A bolsa-auxílio oferecida é, em média, de R$ 600. A partir de março de 98, o CIEE estará formando os primeiros grupos de estudantes para estágios internacionais. "O mercado globalizado exigiu isso", diz Luiz Gonzaga Bertelli, presidente do CIEE. A Fundap - Fundação do Desenvolvimento Administrativo também tem um programa de estágios para pessoas interessadas em trabalhar em órgãos públicos. Estágios, em geral, são oferecidos apenas a partir do segundo ano de curso. O telefone do CIEE é (011) 829-9787 e o da Fundap é (011) 3061-3311.

Finanças: quanto custa o vestibular? E quanto se gasta na faculdade? O preço de um mesmo curso varia de uma faculdade para outra?
Contando manuais e inscrições, os preços dos vestibulares começam na casa dos R$ 50 e chegam quase a R$ 100. Para não torrar dinheiro, é preciso selecionar bem que exames vai prestar. As mensalidades variam bastante nas faculdades privadas. Depende do curso e do número de matérias cursadas. O curso de jornalismo na Universidade Metodista de São Paulo custa mensalmente R$ 415,15. Na PUC-SP, sai por R$ 575. Na Cásper Líbero, o mesmo curso custa R$ 300. Na Escola Superior de Propaganda e Marketing, a mensalidade em Comunicação Social no primeiro ano é R$ 434.

Grêmio ou centro acadêmico: o que é? O que ele pode fazer pelo aluno? Vale a pena participar?
O centro ou grêmio acadêmico é a entidade responsável por representar os interesses dos alunos. Não deveria, portanto, apenas fazer festas e gincanas. Questões como mudanças curriculares, mensalidades e problemas com professores são mais facilmente resolvidos se os alunos têm um centro forte e organizado."É uma grande experiência, é exercer a cidadania", diz Fernando Amorim Lavieri, do centro acadêmico do curso de direito da PUC-SP.

História (resumida) do vestibular. Quando surgiu? Quando passou a ter a forma atual?
O exame de seleção para o ingresso em curso superior tornou-se obrigatório em 1911, mas a denominação "vestibulares" foi criada apenas quatro anos depois. Os exames eram feitos separadamente por faculdade ou área de conhecimento (humanas, biológicas etc), dentro da mesma universidade. A USP unificou o vestibular em 1975 e, no ano seguinte, criou a Fuvest (Fundação Universitária para o Vestibular). Os exames passaram a ser feitos em duas fases.

Internet: ajuda ou atrapalha a estudar? Até que ponto podemos confiar nas informações da rede?
Para obter informações com segurança, o melhor é entrar sempre em sites oficiais, de instituições conhecidas. Informações sobre vestibulares, com datas, conteúdos e leituras obrigatórias, podem ser encontrados em páginas de cursinhos, como a do Etapa (http://www.etapa.com), Objetivo (http://www.objetivo.br) e Anglo (http://www.cursoanglo.com.br). Páginas das universidades e faculdades podem ajudar a escolher o curso. Alguns exemplos são o da USP (http://www.usp.br), o da Fuvest (http://www.fuvest.br), o da Unicamp (http://www.unicamp.br) e da PUC-SP (http://www.pucsp.br).

Jubilamento: que situações podem levar o aluno a ser impedido de continuar o curso?
Na USP, por exemplo, é jubilado quem não se matricula por três semestres consecutivos, sem trancar matrícula, e quem não consegue obter nenhum crédito em quatro semestres consecutivos (para cada matéria na qual o aluno é aprovado, ele recebe créditos, que são "pontos" correspondentes às horas-aula). As universidades públicas são semelhantes à USP. Nas faculdades privadas, as regras variam muito. Na Faap, o jubilamento ocorre quando um aluno é reprovado na mesma matéria mais de quatro vezes. Na ESPM, não existe jubilamento.

Língua estrangeira: quanto é necessário saber? Basta passar na prova do vestibular?
Nas boas faculdades, é preciso, pelo menos, ler em uma língua estrangeira. "Inglês é fundamental. Depois, vem espanhol, pela promessa de oportunidades futuras", diz Antonio Manoel dos Santos Silva, reitor da Unesp. Silvana Case, vice-presidente do Grupo Catho, lembra que falar fluentemente inglês não é só uma exigência da universidade: "qualquer multinacional exige hoje que seus funcionários falem pelo menos o idioma de sua matriz".

Melhores cursos: quais os dados usados pelo Ministério da Educação para estabelecer o ranking?
Segundo as notas dadas pelo MEC, só 15% das faculdades brasileiras receberam conceito "A" e 20% tiveram "B". Abaixo da média ficaram 35% -20% com "D" e 15% com "E". Os critérios do MEC incluíram avaliação dos professores (quantos possuem pós-graduação etc.), dos alunos (a média das notas no "provão" do ministério para cada curso) e da infra-estrutura .

Novos cursos: para onde vai o mercado? As universidades estão lançando novas carreiras?
O curso de relações internacionais, que começa a ser oferecido pela PUC-SP, é uma das novidades do meio acadêmico paulista. As inovações na Unicamp são engenharia de controle e automação e química na modalidade tecnológica. Na USP, o curso experimental em ciências moleculares cria a opção para quem quer trabalhar com pesquisa.

Optativas: quais cursos e faculdades permitem que os alunos escolham entre matérias?
Currículos móveis, com maior número de matérias optativas, são mais frequentes na área de humanas. Medicina, engenharia e direito têm menor flexibilidade.
Optativas são mais comuns nas universidades públicas. No caso de comunicação social na ESPM, por exemplo, a única optativa oferecida é marketing político.

Primeiro colocado: qual é o segredo para passar no vestibular em primeiro lugar?
Primeiro colocado na Fuvest de 1995, Nelson Ferreira, 20, aluno de engenharia de produção da Poli-USP, conta que não tinha muita disciplina. "Estudei um pouco de tudo. Mas quando não queria estudar, não forçava", conta.
Para Ferreira, o primeiro ano foi o mais difícil. "A faculdade é outro mundo. Você tem que aprender a se virar sozinho, tem de ir atrás dos livros."

Queixas: quais são as reclamações mais comuns entre os alunos de primeiro ano?
"Todo primeiro ano é uma decepção", avisa Fernando Amorim Lavieri, representante do centro acadêmico de direito da PUC-SP. A maior dificuldade é adaptar-se. "Não tem nada pronto: você tem de ter disposição para ir atrás. É você que faz o seu curso", afirma. André Luís Leite, coordenador do Cursinho da Poli, identifica como um dos principais problemas a falta de esforço das instituições em promover a adaptação do aluno ao 3º grau. "Os alunos chegam despreparados, tanto em conteúdo como em ritmo de estudo e, por isso, a desistência é grande", diz.

Residência: onde morar ao escolher por estudar em outra cidade? Qual a melhor opção?
Para Márcio Cruz e Carlos Rodrigues, do centro acadêmico da ESPM, "a melhor opção é conhecer um pessoal parecido com você e montar uma república; morar na casa de familiares pode ser complicado". Segundo Paulo Sérgio Barbosa, coordenador dos vestibulares da Unicamp, "em Campinas, o estudante pode gastar entre R$ 250 e R$ 600, se escolher a residência universitária ou a república".
Para morar no Crusp-Centro Residencial da USP-, é preciso entrar com um pedido formal e provar não tem condições de arcar com sua própria moradia.

Sobrevivência no campus: quais as dicas e informações fundamentais para se virar no começo do curso?
A maioria das faculdades e universidades distribuem, no dia da matrícula, um manual do calouro, que procura informar de maneira geral o novo aluno. Pode trazer dicas até de moradia (principalmente no caso das universidades públicas) ou sobre extensões universitárias e as oportunidades para aprender além do curso.

Trocar o curso: e se você percebeu, já na faculdade, que não era essa carreira que queria?
A USP abre oportunidades para transferência de curso apenas se sobram vagas ou do vestibular ou de jubilamentos e desistências. A seleção para essas vagas inclui a análise do histórico escolar, prova e entrevista. Vale para alunos de outros cursos da universidade ou para aqueles fora da USP. Na PUC, a abertura de vagas para transferência é obrigatória. Anualmente, a universidade oferece pelo menos uma vaga em cada curso e até 10% das vagas do vestibular para a transferência de alunos da PUC.

Única tentativa ou prestar vários vestibulares: qual a melhor escolha?
Opte sempre por boas universidades: esta é a resposta unânime. Quando a carreira é muito concorrida, a diferença entre os candidatos que entram e os que ficaram imediatamente abaixo é pequena, às vezes dependendo da sorte. Por isso, se é medicina a sua escolha, não se limite a um só vestibular, sem esquecer, no entanto, de escolher com cuidado as faculdades.

Vagas: com quantos candidatos você está concorrendo por seu lugar no curso escolhido?
Na Unesp, o curso de medicina (Botucatu-SP) é o mais concorrido, com 117 candidatos para cada vaga. Na USP, o mais concorrido é propaganda e publicidade, com 84 inscritos por vaga, seguido por fisioterapia, com 52, e jornalismo e turismo, ambos com 51. Nas faculdades privadas, esse número cai bastante. Jornalismo, por exemplo, tem 11 na PUC-SP e 12 na Fundação Cásper Líbero.

X da questão: qual a diferença entre a prova dissertativa e a de múltipla escolha?
Para Nicolau Marmo, coordenador geral do Sistema Anglo de Ensino, e Dácio Antônio de Castro, supervisor de português do Anglo Vestibulares, o aluno bem preparado responde qualquer tipo de exame. "Uma prova bem elaborada seleciona os melhores candidatos", afirma Paulo Sérgio Barbosa, coordenador-executivo dos vestibulares da Unicamp. Mas em sua opinião, a prova dissertativa dá mais chance ao vestibulando. "Na resposta escrita, tudo que o candidato acertou é transformado em nota".

Zebra: e quando dá tudo errado e o estudante não consegue passar no vestibular.
"É sempre possível dar zebra!", diz a psicóloga Rosely Sayão. Ela explica que passar no vestibular depende de competência, fatores emocionais e sorte.
Se você não passou, aproveite as férias para descansar. Depois, mãos a obra. É importante aproveitar o insucesso para uma reavaliação geral", afirma Paulo Sérgio Barbosa, da Unicamp.

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