São Paulo, quinta-feira, 20 de novembro de 1997 |
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Ajuda do BNDES à Bolsa provoca críticas
FREDERICO VASCONCELOS
"Não me parece que estimular a recompra de ações seja um mecanismo de desenvolvimento social", diz o advogado Renato Ochman, especialista em direito societário. Isso aconteceria, segundo ele, se os recursos fossem destinados para incentivar as exportações ou a criação de uma nova empresa. As opiniões são divergentes: a medida é apoiada pela maioria dos especialistas como um ato emergencial que não fere a legislação. Mas há quem coloque em dúvida se esse é um uso adequado de recursos públicos por um banco oficial de fomento. O BNDES é voltado para o estímulo à produção e ao desenvolvimento social e sua principal fonte externa é o FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador). Mercado estreito Há quem veja ainda o risco de a recompra promover maior concentração num mercado que já é fortemente concentrado (poucas ações respondem pelo grande volume negociado nas Bolsas). "Do ponto de vista meramente jurídico, o minoritário ganha na medida em que há um eventual aumento do preço das ações: ao se enxugar a base acionária, teoricamente o valor das ações aumenta", diz o advogado Luiz Octávio Motta Veiga, ex-presidente da CVM (Comissão de Valores Mobiliários). "Mas do ponto de vista institucional, não é o ideal, esse não é o melhor dos mundos", diz. "A operação aumenta a margem de controle, pode ensejar uma concentração de poder. Tudo vai depender do uso desse poder pelos controladores", diz Veiga. O advogado Modesto Carvalhosa, especialista em sociedades anônimas, diz que a sustentação das Bolsas é uma operação absolutamente normal. "Trata-se de uma operação defensável, legítima e compreensível para o país dos ricos, embora socialmente possa não sê-lo. Mas isso é outra discussão", diz. O que se poderia discutir, segundo ele, são os valores envolvidos, comparando-se com o que o governo destina a projetos sociais. Carvalhosa entende que os valores anunciados não são exagerados para o porte do mercado. Para a recompra de ações, o BNDES acena com R$ 1 bilhão. Já o pacote fiscal lançado na semana passada, por exemplo, atribuiu ao BNDES apenas R$ 400 milhões para o Proex (Programa de Financiamento à Exportação). Interesse do país O clima de pânico nas Bolsas talvez explique por que o anúncio da linha de financiamento não provocou maiores discussões. Em tempos normais, a decisão seria definida como uma intervenção governamental no mercado. O BNDES evita assumir que o objetivo é, conforme um advogado ouvido pela Folha, dar uma "ajuda" ao mercado de capitais. Segundo alguns especialistas, ao suspender o pregão, por exemplo, as autoridades não interferem nas cotações; ao abrir uma linha de crédito para a recompra de ações, o governo interfere na demanda. A operação de recompra de ações do BNDES está sendo vista como um "POC disfarçado" (o POC era um programa de auxílio aos acionistas para a compra de ações de uma empresa; a nova linha de crédito promove a recompra de ações pela empresa). O BNDES também oferecia financiamentos para aumentos de capital dentro de uma determinada política industrial (Procap). "Acho que esse financiamento, sendo em condições de mercado, é uma decisão de política comercial e industrial do BNDES para assegurar o desenvolvimento econômico e social do país", diz o advogado Arnoldo Wald, também ex-presidente da CVM. "Num momento de crise, acho que a operação é viável. Do mesmo modo que o banco pode financiar um equipamento, pode fortalecer uma empresa pela recompra das ações", diz. Segundo Wald, "não estão manipulando, não há nada clandestino". "Não há risco para o BNDES, são empresas sérias", diz. "Pode-se discutir se isso é bom ou ruim, mas a medida é interessante para o país", diz. Sem restrições "Não vejo nenhum problema na operação", diz Ary Oswaldo Mattos Filho, outro ex-presidente da CVM. "A recompra de ações em outros países é corriqueira", diz. "O que o mercado não pode ter é uma empresa comprando e vendendo escondido", diz. O BNDES, segundo ele, pode alegar que está protegendo sua carteira de ações (do BNDESpar). Mattos Filho entende que a crise não é das Bolsas -elas são um termômetro: "Na medida em que as empresas saiam comprando suas próprias ações, isso dá uma sinalização de confiança nas empresas." "Toda e qualquer medida que possa trazer de volta a tranquilidade ao mercado é bem-vinda", diz Roberto Faldini, que foi presidente da CVM e da Abrasca (reúne as empresas de capital aberto). Segundo Faldini, "o Proer também foi muito criticado porque pegava recursos do mercado e canalizava para a sobrevivência do sistema bancário". "Da mesma maneira, o valor das cotações das empresas deteriorou-se, mas não é correto aumentar a crise com uma maior desconfiança", diz Faldini. Texto Anterior: Mutuário pode mudar data para pagamento Próximo Texto: Telebrás gasta R$ 100 mi Índice |
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