São Paulo, quinta-feira, 20 de novembro de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Encontro revela novo sexo líquido francês

DAVID DREW ZINGG
EM SAMPA

"Já para as noites mais animadas (...) o ideal é um gole de champanhe francês -bebido diretamente da garrafa."
Reportagem da revista "Isto É" sobre a nova moda do verão

Hanói, Vietnã, 20 de novembro (IPS). No calorosamente aplaudido discurso que proferiu ontem na abertura da cúpula dos países francófonos, o presidente francês, Jacques Chirac, pediu a implementação urgente das novas diretrizes francófonas para a prática de se tomar champanhe diretamente da garrafa.
No discurso bem-vindo que marcou a cerimônia de abertura do sétimo encontro mundial de líderes dos países de língua francesa, Chirac disse aos dirigentes presentes que, apesar de sua profunda preocupação com questões como a fome mundial, as doenças e o analfabetismo, eles deveriam dirigir sua atenção ao que qualificou como "a grande idéia do gargalo".
"Precisamos aumentar as vendas de champanhe francês a qualquer custo", disse o líder francês, "mesmo que isso signifique quebrar todas as tradicionais regras de etiqueta francesas".
Chirac parou para dar um exemplo à platéia atenta. Arrancando a rolha de um garrafão fechado de Dom Perignon e respirando fundo, ele virou o enorme recipiente em seu "gargalo" profundo.
Proust e os maus modos
Admitindo que qualquer pessoa francesa média que já tenha lido seus sete volumes de Proust ficará profundamente chocada com sua proposta, o presidente francês, dando mostras de espírito pioneiro, explicou: "Em tempos de adversidade como estes que vivemos, a única maneira de sobreviver é esquecer a enologia, que, de qualquer jeito, soa como um ato de sexo desnatural".
Policial: "Vossa excelência, flagramos esta pessoa cometendo enologia com uma garrafa de champanhe de ponta-cabeça".
Juiz: "Dois anos no xadrez".
Chirac confiou à platéia que, no momento em que falava, uma experiência secreta de venda de champanhe "no gargalo" estava sendo conduzida num país sul-americano longínquo que, segundo ele, "sempre engoliu sem questionar qualquer 'merde' cultural que despejássemos sobre sua população".
O presidente se apressou a apontar até que ponto a produção do champanhe foi modernizada.
"Alguns brasileiros, por exemplo, acreditam que o champanhe ainda é feito por camponeses que amassam as uvas com os pés descalços, deixando resquícios de unhas do pé e outros resíduos asquerosos no líquido borbulhante", observou.
"Obviamente isso é bobagem pura", afirmou o presidente, categórico. "Os fabricantes de vinho modernos de hoje amassam as uvas com máquinas modernas e higiênicas que são verificadas diariamente por especialistas médicos a serviço do governo. É apenas depois desse processo que os trabalhadores acrescentam os resquícios de materiais vindos de pés de camponeses, para acrescentar o sabor típico do vinho."
"O produto final é um conjunto delicado e complexo de elementos que interagem sutilmente e que, se engarrafados com cuidado, envelhecidos por anos sob condições climáticas corretamente corrigidas e, finalmente, submetidos à decantação cuidadosa, raramente adquirem um sabor tão bom quanto uma Brahma", acrescentou o presidente.
Malícia francesa
Segundo observadores, a cúpula francófona em Hanói esteve repleta de brincadeiras francesas.
O ministro especial francês de Aquela Horrível Palavra Inglesa, "marketing", homenageou as empresas produtoras de champanhe que estão introduzindo no Brasil o inusitado método "gargalo" de desfrutar a cara bebida borbulhante à base de suco de uvas.
Ao agraciar as empresas com a Cruz de Serviço Distinto, de primeiro nível, por Persuadir Pessoas a Adotar a Idéia Estúpida de Beber Diretamente do Gargalo, o ministro revelou que duas companhias produtoras de champanhe francês realizaram testes rigorosamente controlados com pessoas "de mentalidade aberta, sem preconceitos", num "clube moderníssimo" de São Paulo.
"Os resultados", declarou o ministro, "foram notáveis, eu diria até, históricos".
"Em primeiro lugar, descobrimos que o champanhe exerce exatamente o mesmo efeito alcoólico sobre o consumidor quando derramado do gargalo diretamente em sua boca, nariz ou orelha."
"Em segundo lugar -e esse talvez seja o ponto mais importante-, nossa pesquisa revelou que, quando tomado pelo método do gargalo, praticamente ninguém consegue distinguir entre um champanhe raro envelhecido e um picolé derretido, a não ser que leia os respectivos rótulos dos diferentes produtos."
Agora Sabemos
Finalmente, Joãozinho, descobrimos por que você se castiga todas as semanas com a leitura desta coluna.
É porque, diferentemente do restante deste grande jornal, a coluna do tio Dave sai repleta de erros idiotas, todas as semanas. Se a Folha obteve o certificado ISO 9000, representativo, entre outras coisas, de sua ausência de erros, esta coluna teria dificuldade em conquistar um certificado ISO 90.
Na semana passada, ao descrever os adoráveis gorilas Koko e Michael, que pintam quadros surpreendentemente bons que chegam a aproximá-los de alguns artistas altamente qualificados que conhecemos, eu lhe dei o endereço errado na Internet. Se você navegar até www.gorilla.org, vai poder se deleitar com suas pinceladas intrigantes.

Tradução Clara Allain

Texto Anterior: Herivelto Martins ganha homenagem
Próximo Texto: Saramago pede compreensão extraliteratura
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.