São Paulo, domingo, 7 de dezembro de 1997
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Sentimentos de perplexidade

MARILENE FELINTO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A morte da escritora Clarice Lispector, em 9 de dezembro de 1977, deixou um sentimento de perplexidade nos meios literários e acadêmicos que parece resistir até hoje.
Mesma perplexidade verificada quando do surgimento -em 1943, com "Perto do Coração Selvagem"- de uma obra que, de tão diferente, precisaria de muito mais do que esses 50 anos seguintes para ser digerida. A despeito de inúmeros estudos críticos, teses e biografias publicadas nesses 20 anos desde a morte de Lispector, um dos centros de discussão sobre sua obra ainda é "como se deve ler Clarice".
Como se o "verdadeiro choque" experimentado pelo crítico em 1943 perdurasse. O choque provocado por uma literatura que "adentra domínios pouco explorados, um pensamento cheio de mistério, capaz de nos fazer penetrar em alguns dos labirintos mais retorcidos da mente" (Antonio Candido). Uma literatura -escrita por uma mulher- de significação incomum no plano da linguagem, de mestria excepcional, que ocupa, em nossas letras contemporâneas, um lugar isolado, singular.
A mesma perplexidade. Trata-se ainda da obra impalpável da escritora impalpável. Pouco tempo antes de morrer, Clarice Lispector escreveu "eu serei a impalpável substância que nem lembrança de ano anterior substância tem", essa espécie de profecia.
Nascida na Ucrânia em 10 de dezembro de 1925 (ou 1920, controvérsia que seus biógrafos ainda não resolveram), a escritora só fez fechar sobre si -ao morrer na exata véspera de completar 52 (ou 57) anos- o ciclo de singularidade e mistério que perseguiu sua figura pública, uma de suas maiores queixas.
Queria ser tratada como pessoa comum e palpável. Só por acaso nasceu numa aldeia ucraniana, quando seus pais, judeus russos, emigravam para o Brasil. Chegou aqui com dois meses de idade e passou a infância em Recife. Depois foi morar no Rio de Janeiro, onde a família Lispector se estabeleceu.
Formou-se em direito e casou-se em 1943 com o diplomata Maury Gurgel Valente. Por conta da profissão do marido, viveu 16 anos fora do Brasil, na Itália, Suíça, Inglaterra e nos EUA. Teve dois filhos com Gurgel Valente, de quem se separou em 1959, ano em que voltaria a viver no Brasil. Foi por mais de dez anos cronista do "Jornal do Brasil", a partir dos anos 60.
Entre suas obras mais conhecidas estão as coletâneas de contos "Laços de Família" e "Felicidade Clandestina" e os romances "A Paixão Segundo G.H." e "A Hora da Estrela".

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