São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 1997
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Coréia deflagra guerra comercial na Ásia

OSCAR PILAGALLO
ENVIADO ESPECIAL A SEUL

A semana passada poderá entrar para a crônica financeira mundial como os cinco dias que abalaram a economia da Coréia do Sul.
Nesse período, a moeda nacional, o won, despencou seguidamente, batendo no limite de queda diário, de 10%.
A situação só foi contornada na sexta-feira, quando o Banco da Coréia, o banco central, interveio pesadamente para tentar conter a pulverização da moeda.
O governo anunciou um empréstimo de emergência equivalente a US$ 6,5 bilhões para manter à tona bancos e instituições financeiras que enfrentam crise de liquidez sem precedentes na história recente do país.
O mercado de câmbio reagiu e, nos últimos momentos de negociação na semana passada, obteve-se a estabilização do won. Mas o problema é que naquela altura o estrago já havia sido feito.
O won perdeu mais de 50% de seu valor desde o início do ano, a maior parte da desvalorização tendo sido registrada durante a turbulência da semana passada.
Há um ano, eram necessários menos de 850 wons para comprar um dólar. Hoje precisa-se um pouco mais do que o dobro. A moeda está cotada ligeiramente acima de 1.700 wons.
A guerra comercial
O colapso da moeda coreana está provocando uma guerra comercial na Ásia, região cuja explosão de crescimento nas últimas décadas foi baseada nas exportações.
A mudança no câmbio na Coréia barateia os produtos do país no exterior. Quanto mais cai o won, mais diminuem os preços das exportações do país.
A lógica é a seguinte: como os exportadores recebem em moeda forte, eles poderiam vender pela metade do preço e, ainda assim, estariam recebendo a mesma quantidade de wons.
A queda dos preços não chega a ser proporcional, na maioria das vezes, à desvalorização do câmbio. Mas é certo que, pressionados por uma economia que deverá ter crescimento anêmico para os padrões asiáticos, os exportadores não estão deixando passar a oportunidade de vender mais.
A regra vale para todo o comércio exterior da Coréia. O Brasil, por exemplo, gastará menos para importar produtos coreanos e, na mão contrária, suas exportações ficarão relativamente mais caras.
Para o Brasil, a situação não é preocupante porque os perfis das exportações são diferentes.
O problema maior está na própria Ásia, onde as principais economias, por serem similares, concorrem fortemente entre si.
O caso japonês
O Japão está sendo um dos países mais atingidos pela queda vertiginosa do won. As duas economias do Nordeste Asiático, além de geograficamente próximas -a península coreana e as ilhas japonesas são separadas pelo mar do Japão-, têm mais características em comum do que com os "tigres" do sudeste do continente.
A estrutura de exportação dos dois países está concentrada em setores como eletrônica, siderurgia, construção naval e indústria automobilística.
Em consequência da desvalorização do won, as ações de siderúrgicas japonesas, como Nippon e Kawasaki, desabaram na semana passada na Bolsa de Tóquio.
Quanto aos papéis de megaempresas do setor eletrônico, tiveram mau desempenho em todo o mundo devido à perspectiva de maior competitividade por parte dos produtores coreanos.
Busca de dólares
Outro país cujas exportações também estão ameaçadas é Taiwan, grande fabricante de computadores e chips.
No mês passado, antes portanto das desvalorizações mais recentes, os preços dos chips no mercado internacional despencaram quase 20%. Hoje podem ser encontrados pela metade do valor do início do ano e talvez não tenham ainda chegado ao fundo do poço.
Para os coreanos, não se trata apenas de oportunidade comercial. Os grandes conglomerados aproveitam a adversidade para tentar obter pelo menos parte dos dólares necessários para pagar as imensas dívidas externas.
O Japão, cuja economia encontra-se estagnada e agora enfrenta a perspectiva de recessão, parece estar mais preocupado com os efeitos do câmbio coreano em suas exportações do que com o impacto em seu sistema financeiro da crise bancária no país vizinho.
Os bancos japoneses, eles próprios em situação delicada, anteciparam-se à crise e reduziram de US$ 24 bilhões para US$ 15 bilhões os empréstimos à Coréia.
O efeito comercial da desvalorização do won é em parte compensada pela queda de outras moedas da região.
O iene, por exemplo, vem se desvalorizando em relação ao dólar. O dólar de Taiwan também perdeu terreno em relação à moeda norte-americana. Mas esses movimentos foram muito menos intensos do que a queda do won.
Poucos analistas prevêem o que pode acontecer com a moeda a partir de amanhã, quando os mercados reabrirem a apenas quatro dias da eleição presidencial.
Mas, sem intervenção do governo, a tendência é de baixa.

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