São Paulo, domingo, 14 de dezembro de 1997
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Asiáticos reagem ao modelo "latino" do FMI

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Na semana passada os tremores na Coréia do Sul voltaram a dominar o cenário internacional. A palavra "moratória" circulou de novo nos meios financeiros globais.
Mesmo depois do megapacote prometido pelo Fundo Monetário Internacional, aumentaram as dúvidas sobre a capacidade coreana de pagamento de uma dívida de curto prazo que já está sendo calculada em US$ 100 bilhões.
É importante lembrar que a Coréia do Sul está às vésperas de uma eleição presidencial. A reação popular ao acordo com o Fundo foi a de sempre. Pelo menos um candidato já promete uma renegociação caso seja eleito.
Ou seja, as dúvidas sobre a crise asiática não resultam apenas da comparação entre recursos disponíveis e compromissos a pagar. A politização do drama é crescente.
Na última sexta-feira o "International Herald Tribune" registrou a maré montante de reações ao receituário do Fundo.
Líderes políticos e empresariais asiáticos já protestam contra o uso de um medicamento errado, "latino-americano", nos seus países. Eles dizem que o FMI recomenda pacotes de redução do tamanho do Estado e recessão desenhados para países onde os problemas resultam de governos gastadores, que eles associam à América Latina. A crise recente na Ásia, dizem, é fruto de uma euforia de gastos e investimentos das grandes corporações, não dos governos.
Tudo não passaria do habitual cabo-de-guerra entre FMI e governos em pânico não fosse a intervenção no debate de Jeffrey Garten, diplomata e ex-subsecretário de Comércio dos EUA, agora diretor da "Yale School of Management". Ele diz que "é legítimo questionar se as receitas do FMI não seriam mais relevantes para crises do tipo latino-americano".
Assim, parece evidente que as reações políticas à intervenção do FMI na crise asiática podem trazer mais turbulência à região que a mera percepção de insuficiência dos recursos disponíveis para apagar o incêndio financeiro.
A novidade da semana passada, portanto, é mais política do que econômica. Se de um lado os coreanos ameaçam com uma moratória, nos EUA cresce o número dos que recomendam a quebra pura e simples da Coréia do Sul.
Isso mesmo, uma implosão. Recomendada por Peter Kenen, um dos especialistas em finanças da Universidade de Princeton.
Ele sugere guardar os bilhões prometidos à Coréia para ajudar os países mais pobres que viessem a sofrer com os efeitos da sua falência. Os norte-americanos detêm apenas US$ 10,6 bilhões de créditos na Coréia do Sul (2,9% de seus empréstimos internacionais). Seria fácil absorver uma declaração de perda total desses ativos.
A pergunta seguinte é: quem é o maior credor da Coréia do Sul? A resposta, já quase óbvia, é Japão. Mas há também gente disposta a acreditar que o sistema bancário japonês, que já está cambaleante, não soçobraria de uma vez por todas caso a Coréia do Sul fosse à breca. Entre os que torcem por uma catástrofe benigna está Jesper Koll, economista do JPMorgan.
Nesse contexto, a ameaça de renegociação feita por candidatos coreanos é até uma demonstração de bom comportamento e seriedade. Mas é bom lembrar que a Coréia do Norte ainda é vista, em alguns meios, como ameaça à segurança regional. A questão que então retorna é se os EUA estariam mesmo dispostos a deixar a Coréia do Sul quebrar.

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