São Paulo, terça-feira, 16 de dezembro de 1997
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UM PLANO CONTRA A MISÉRIA

Suscita um sentimento ambíguo o fato de que certos indicadores sociais brasileiros melhorem mesmo que as grandes políticas econômicas raramente levem em conta a pobreza. A agitada sucessão de governos e de planos econômicos não parece ter muita relação com a corrente subterrânea e silenciosa que faz com que, muito aos poucos, a população sofra um pouco menos com a fome, com a falta de educação e de saúde.
Esse sentimento, que oscila do alento ao desânimo angustiado, é provocado pela série de estatísticas socioeconômicas divulgadas nas últimas semanas pelo IBGE e pelo Nupens (Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde), da Universidade de São Paulo.
O Nupens informa que a subnutrição vem diminuindo, como a mortalidade infantil. Cada vez mais gestantes têm acesso a um hospital para o parto e mais crianças são vacinadas. Causas difusas e variadas explicam a melhora: mães com mais anos de escola, menos filhos por mulher, mais água encanada, certos programas sociais regionais -como os agentes de saúde cearenses. Não se vê aí o dedo de políticas sistemáticas. Trata-se de uma mistura de progresso quase vegetativo da oferta de serviços sociais com a redução da natalidade, muitas vezes iniciativa da massa de mulheres anônimas.
Apesar disso, a mortalidade infantil nas regiões mais ricas ainda é três vezes maior que a verificada na Europa ocidental. A desnutrição afetava 1 em 4 crianças de até 5 anos em 1975; hoje, 1 em 13 ainda sofre com a fome.
Esses números mostram que, mesmo sem grandes programas nacionais e agressivos contra a miséria, ela vem diminuindo com constância. É, de certo modo, animador. Mas poderia ser melhor se a distribuição de renda, grande fator de desigualdade social, fosse outra. No entanto, segundo dados do IBGE, ela permanece no mesmo nível dos anos 80. Isto é, nada se avançou em relação a uma situação de grave injustiça.
Mas a evolução desses indicadores mostra que o Brasil pode reduzir com mais rapidez suas iniquidades. Falta dar sentido de urgência, considerar com a devida importância o fato de, por exemplo, ainda haver no país 17 milhões de indigentes -tal como se consideram importantes crises bancárias ou financeiras.

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