São Paulo, quinta-feira, 18 de dezembro de 1997
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O Nordeste como solução

LUÍS NASSIF

De todos os programas em ação no país, provavelmente nenhum possui potencial tão virtuoso de implicações sociais, políticas e econômicas quanto o "Programa de Apoio e Desenvolvimento da Fruticultura Irrigada no Semi-Árido Tropical Brasileiro", um dos projetos incluídos no "Brasil em Ação".
Para ser bem-sucedido, um programa precisa ter boa concepção e implementação eficiente. A cautela recomenda que não se louve o resultado antes da ação prática demonstrar sua eficácia.
Mesmo assim, do ponto de vista potencial, as projeções são extraordinárias. É possível, em um prazo de dez anos, integrar 1 milhão de hectares do semi-árido nordestino à economia formal, gerando 1 milhão de empregos diretos, exportações da ordem de US$ 10 bilhões anuais, um aumento do PIB da ordem de US$ 50 bilhões (o PIB de todos os Estados nordestinos não chega a US$ 120 bilhões), além de trazer um potencial de modernização e de equilíbrio social inéditos na história nordestina.
Estimativas
Os parâmetros de análise do potencial do setor foram buscados na economia chilena. No ano passado as exportações brasileiras de frutas frescas chegaram a apenas US$ 108 milhões. No Chile, com 186 mil hectares de áreas cultivadas, em 1996 as exportações alcançaram US$ 1,4 bilhão; o efeito sobre o PIB alcançou US$ 14 bilhões. E tem-se lá limitação de água (que depende do degelo dos Andes) e um custo alto de terra -US$ 15 mil o hectare com água. O potencial de expansão é de apenas mais 20 mil hectares.
O Chile e a Califórnia (os dois maiores centros produtores de frutas) são semi-áridos temperados. O semi-árido tropical do nordeste é único no mundo. É como uma estufa natural. Há temperaturas altas e regulares, entre 25 graus e 30 graus o ano todo. A luminosidade é constante, de 3 mil horas/sol por ano. Há baixa umidade relativa do ar. Existe ampla disponibilidade de recursos hídricos em torno dos rios São Francisco e Parnaíba.
Esse ambiente permite elevada produtividade, em muitos casos até duas colheitas/ano. As frutas são mais doces e sadias, e há baixa incidência de pragas e doenças, reduzindo a necessidade de defensivos agrícolas. Há um crescimento acelerado dos vegetais, encurtando o período de investimento, e possibilidade de maior controle sobre o processo produtivo.
A produção se dá ao longo de todo ano, permitindo a comercialização na entressafra e reduzindo os custos com estocagem. O Chile e a Califórnia só produzem seis meses por ano. A produção contínua e a alta produtividade viabilizam a entrada de capital de risco.
O programa
O que se fez foi selecionar 14 áreas passíveis de irrigações a uma distância curta do rio. A cada ano pretende-se incorporar 100 mil hectares.
A terra custa R$ 200 o hectare, acessível a qualquer investidor. A irrigação implicará baixos investimentos, porque feita às margens do rio.
No período de implantação, serão absorvidos 200 mil empregos -dois por ha. Depois, 100 mil empregos/ano. Hoje em dia a migração nordestina é da ordem de 350 mil pessoas por ano. Com 100 mil empregos diretos, pode-se estancar todo o processo migratório.
A idéia é que o governo entre com o gerenciamento geral do projeto, os investimentos em infra-estrutura (transporte, água, energia etc.), o monitoramento da sustentabilidade ambiental, defesa fito-sanitária, financiamento e apoio tecnológico, por meio da Embrapa.
Pequenos e médios
Não se pensa em montar modelo em cima de grandes produtores. A idéia é uma cadeia produtiva formada por algumas dezenas de grandes, centenas de médios e milhares de pequenos. Dez empresas já se dispuseram a formar 6.000 hectares cada para o primeiro ano -60% da meta do primeiro ano.
Quando o módulo estiver plenamente desenvolvido, estima-se que atraia cem embaladoras de frutas, cem frigoríficos, 30 fábricas de conservas e 20 fábricas de sucos. A produção será da ordem de 140 milhões de caixas de frutas, representando 500 partidas de navio por ano -algo capaz de viabilizar a modernização dos portos nordestinos.
Para a colonização, vai ser feita uma propaganda não apenas entre brasileiros, mas em outros países. O secretário-geral do Ministério da Agricultura, Ailton Barcellos, já esteve seis vezes na Alemanha, e conseguiu que o maior comercializador mundial de frutas -a Atlanta- montasse escritório em Petrolina.
Viabilizado o projeto -diz Barcellos- será possível provar que, antes de problema, o Nordeste poderá ser uma solução.
O programa será um desafio nacional, tanto pela complexidade técnica como pela necessidade de continuidade.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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