São Paulo, domingo, 2 de fevereiro de 1997
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Executivo volta a influir no Legislativo

LUCIO VAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A intervenção do Poder Executivo na eleição para a presidência da Câmara lembra uma prática comum no regime militar. O Palácio do Planalto apóia o deputado Michel Temer (PMDB-SP) para garantir a aprovação da emenda da reeleição em segundo turno.
Após a redemocratização do país, em 1985, não há registro de intervenção tão direta do presidente da República e dos seus ministros na busca de votos para um candidato a presidente da Câmara.
Integrantes do comando da campanha de Temer admitem que a eleição para a presidência da Casa equivale à votação do segundo turno da emenda da reeleição. Eles esperam até repetir o placar de 336 votos, se possível com sobra.
O candidato Prisco Viana (PPB-BA) condena a ação do governo Fernando Henrique Cardoso: "Os precedentes disso são do período autoritário". Prisco fala com conhecimento de causa: apoiou o regime militar até o fim.
Prisco diz ter uma arma para enfrentar a pressão: o voto secreto: "Está havendo uma tendência de transferir o êxito da reeleição para a eleição da Câmara. Mas agora será voto secreto. O deputado estará imune a pressões e retaliações".
Prisco cita três casos ocorridos no regime militar que lembram a atual situação. Em 1965, o presidente Castello Branco teria eleito Bilac Pinto (UDN) numa disputa com Ranieri Mazzilli (PSD), que tentava a sétima reeleição.
Em 1977, Herbert Levy (Arena) lançou-se na disputa contra o candidato oficial do presidente Ernesto Geisel, o deputado Marco Maciel (Arena). O deputado José Bonifácio (Arena) levou um recado de Geisel para Levy.
Em regime revolucionário, presidente não perde eleição, teria dito o presidente. Levy retirou a candidatura no dia seguinte.
Figueiredo
No governo de João Baptista Figueiredo, em 1981, ministros e governadores foram atrás de votos no Congresso para eleger Nelson Marchezan (PDS), ex-líder do governo, na disputa contra Djalma Marinho. Marchezan venceu com apenas 37 votos de diferença.
A tradição de um governista presidir a Câmara foi mantida após a redemocratização. Os deputados Ulysses Guimarães (PMDB-SP) e Paes de Andrade (PMDB-CE) foram eleitos no governo de José Sarney. Mas o processo foi bem mais independente.
Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) foi a primeira exceção após 1964. Foi eleito quando liderava a oposição contra Fernando Collor. A tradição mandava que o maior partido fizesse o presidente da Câmara.
Inocêncio Oliveira (PFL-PE) e Luís Eduardo Magalhães (PFL-BA) quebraram essa tradição. Mesmo não integrando a maior bancada, Inocêncio foi eleito no governo Collor, e Luís Eduardo, no governo FHC.
Neste ano, o governo retomou a pressão sobre o Congresso. O ministro Sérgio Motta (Comunicações) tentou convencer Wilson Campos (PSDB-PE) a retirar a sua candidatura para facilitar a eleição de Temer e garantir a aprovação da emenda da reeleição.
Temer enfrentou os senadores Iris Rezende (GO), Jader Barbalho (PA) e José Sarney (AP) e conseguiu 67 votos do PMDB. Agora, se não for eleito presidente da Câmara, seu partido não ajudará a aprovar o segundo turno da reeleição.
FHC entrou na campanha e autorizou seus ministros a participar do corpo-a-corpo com os deputados. A primeira reunião do comando da campanha de Temer após a aprovação do primeiro turno da reeleição foi coordenada pelo próprio Sérgio Motta.
O líder do PMDB justifica a ação do governo: "O apoio não é na base da barganha. É pelo trabalho que realizei como líder aliado".
Prisco acha que o governo faz uma "interferência insólita e inaceitável, que não faz jus à tradição das relações entre os poderes". Campos diz que acredita na neutralidade de FHC, mas ataca os ministros: "Se não temos ingerência sobre a nomeação deles, seria melhor que nos deixassem em paz".

LEIA EDITORIAL sobre o atual panorama político à pág. 1-2

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