São Paulo, domingo, 2 de fevereiro de 1997
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O povo bestificado

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Pasmosa a indiferença do povo diante da votação em primeiro turno da reeleição-já. Tivemos o antecedente histórico registrado por Aristides Lobo -hoje nome de rua onde há um técnico em ar refrigerado que fui buscar para quebrar um galho doméstico. Tal como no dia da proclamação da República, o povo estava bestificado, inclusive na rua que tem o nome de quem constatou a bestificação popular.
Não se ouviu um grito, nem contra nem a favor. Evidente que a estabilidade do real anestesiou o medo. No dia seguinte ao da votação da emenda, foi revelado oficialmente que a taxa do desemprego cresceu 16% em 1996. Quem tem aquilo tem medo. Quem tem emprego tem medo de perdê-lo. É a vida.
Será mole para o governo obter a aprovação no segundo turno. E, se mais houvera turnos, ganharia todos. Venho insistindo na analogia (excluo a identidade) do neoliberalismo de FHC com o nazismo. Para sorte nossa, não temos reivindicações territoriais e raciais -ainda bem.
Os métodos legais (insisto também nesses "legais") que o nazismo empregou para impor um salvador da pátria, um homem assinalado pelo destino, são os mesmos. Durante a semana, em Brasília, tanto a sessão em si como seus antecedentes lembraram as votações no Reichstag, quando Hitler paulatinamente ia obtendo maiores somas de poder. Há uma foto de Goering, na presidência do Parlamento, depois de uma eleição bem parecida com a nossa, fazendo o "V" da vitória -anos antes de Churchill popularizar o gesto em sentido contrário. E muito antes, também, de FHC fazer o mesmo gesto.
E a foto do apoio (e da alegria) dos prefeitos ao líder máximo é, sem tirar nem pôr, a mesmo foto dos candidatos a gauleiters em torno do führer. Tal como no caso do povo bestificado, a história se repete.

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