São Paulo, domingo, 2 de fevereiro de 1997
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O vinho nosso de cada dia

MARIANE COMPARATO

Nova legislação sobre vinhos pretende impedir entrada de bebida de má qualidade no Brasil, mas coloca em risco os melhores
Reservar um Château Lafite ou um Mouton Rothschild para uma grande ocasião vai dar muito mais trabalho a partir de 15 de maio.
A lei seca ainda não chegou ao Brasil. Mas quem não se contenta com um vinho que não seja de primeira linha corre risco de aderir ao uísque ou a outra bebida alcoólica disponível no país.
O Ministério da Agricultura e do Abastecimento baixou uma portaria em 15 de janeiro que muda as regras para a importação dos vinhos.
O intuito declarado é impedir a entrada de vinhos de má qualidade no país. Na prática, o resultado pode ser exatamente o contrário, e os melhores vinhos correm o risco de ficar de fora.
Interessa aos fiscais brasileiros saber se o processo de industrialização do vinho, suas condições de higiene e tecnologia são "aceitáveis" para os padrões brasileiros. Para isso, vale até uma inspeção "in loco" nas propriedades francesas e italianas, por exemplo.
"O Brasil tem determinadas exigências que a França não tem", diz o coordenador da Inspeção Vegetal do ministério, Ricardo Cavalcanti Jr.
O problema é que os produtores de vinhos europeus, considerados internacionalmente como os melhores, não parecem estar interessados em uma parceria com o Brasil.
A importação desses vinhos acaba sendo quase sempre baseada mais em uma relação direta entre o produtor e o importador brasileiro que em interesses comerciais. Um país que cause entraves para tal comércio é riscado da lista.
Sobram então os vinhos produzidos em larga escala, mais industrializados -atendendo aos desejos do ministério brasileiro-, mas, muitas vezes, de qualidade inferior.
Produção nacional
Se, por um lado, os consumidores de vinho de alta qualidade estão descontentes, por outro, a Uvibra (União Brasileira de Vitivinicultura), a associação dos produtores de vinho, entende que a lei é justa, pois pode tornar o produto brasileiro mais competitivo.
"O vinho branco alemão de mesa tem preço baixo e é de má qualidade. Os vinhos brasileiros não tinham como competir no preço", argumenta o vice-presidente da área de vinhos finos da Uvibra, Adolfo Alberto Lona. A solução encontrada foi impor obstáculos à importação.
O dono da casa de vinhos importados Maison du Vin, Miguel Juliano, rebate: "O Brasil tem uma vinicultura incipiente, não temos solo nem clima para fazer vinho. O lobby gaúcho, não satisfeito com os altos impostos, passou a criar dificuldades intransponíveis."
O advogado Carlos Alberto Pinto Dias, especialista em direito trabalhista e comercial, também critica a portaria, qualificando-a de inviável. "O governo deve tomar precauções para que o vinho seja bom, mas a lei não pode ser estendida a todos os estabelecimentos vinícolas. Uma nova legislação com mais bom senso deve ser elaborada."

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