São Paulo, domingo, 9 de fevereiro de 1997
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Leishmaniose se torna 'doença emergente' no Brasil

VANESSA DE SÁ; VINICIUS TORRES FREIRE
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil tem mais um nome para colocar na sua lista de "doenças emergentes" e da pobreza: a leishmaniose. A incidência da doença mais do que dobrou em uma década e está se expandindo por todo o país. No ano passado, mais de 39 mil pessoas foram afetadas, principalmente no Norte e Nordeste.
Desde 1980, quando as estatísticas sobre o problema se tornaram mais confiáveis, cerca de 300 mil pessoas ficaram doentes por causa de algum dos vários tipos do protozoário leishmania.
A leishmaniose desfigura e mata. A leishmaniose cutânea, também chamada "úlcera de Bauru", pode causar dezenas de feridas que deixam cicatrizes profundas na pele. Num estágio avançado da doença, a mucosa do boca e do nariz dos doentes são destruídas.
A leishmaniose visceral, conhecida popularmente como calazar, provoca aumento exagerado do fígado e do baço, febres, perda de peso, suor intenso e anemia. Se não tratada, é mortal em 95% dos casos. No Brasil, o número de mortes por calazar é estimado em cerca de 120 por ano.
A doença é transmitida de animais para o homem por meio da picada dos mosquitos flebotomídeos. O flebotomídeo fêmea injeta no homem o protozoário leishmania, que causa a doença.
Animais silvestres como o cachorro-do-mato, o preá, o rato-do-mato e gambás são reservatórios da leishmania. Isto é, esses animais são infestados pelo protozoário, ser vivo de uma célula só. No entanto, o cão doméstico está se transformando no principal reservatório da leishmania nos ambientes urbanos.
Com a expansão do mal, cientistas avaliam que o ciclo de transmissão da leishmaniose começa a não passar mais pelos animais. Isto é, o mosquito picaria uma pessoa infectada, e não um animal, e passaria adiante a leishmania.
Segundo Hooman Momen, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (RJ), cientistas da fundação e da Universidade Federal de Minas Gerais estão desenvolvendo ou testando vacinas brasileiras e americanas contra a doença, mas em todo o mundo ainda não há proteção imunológica disponível.
Pedro Sadi Monteiro, gerente do Programa de Controle do Calazar do Ministério da Saúde, diz que o aumento do número de casos registrados se deve a dois fatores. Um seria meramente estatístico. A partir de 1994, o ministério elaborou um programa de controle, diagnóstico e tratamento do calazar, o que melhorou o sistema de notificação dos casos. Mas Sadi considera que houve um aumento real da incidência da leishmaniose visceral devido à deterioração da qualidade de vida da população e da forma de urbanização.
Segundo a Coordenação Nacional de Dermatologia Sanitária do ministério, que coordena os trabalhos sobre leishmaniose cutânea, a expansão da doença acompanha a viagem do mosquito e do parasita das zonas rurais e endêmicas (onde a doença é constante) para as regiões próximas às cidades.
A leishmaniose mais comum no país é a cutânea. Norte e Nordeste tiveram 75,4% dos casos de 96. Foram mais de 35.600 casos no ano passado, contra 3.783 da visceral (dos quais 3.417 no Nordeste).
A incidência da doença aumentou 118% entre 1985 e 1995. Em 1985, cerca de 10 brasileiros em cada 100 mil ficavam doentes de leishmaniose por ano; em 1995, a incidência subiu para quase 23 casos em cada 100 mil pessoas.
O maior aumento da incidência de leishmaniose cutânea no período 85-95 ocorreu no Nordeste: 167%. Apenas Santa Catarina não registrou casos autóctones (infecção no próprio Estado).

LEIA MAIS sobre a leishmaniose na página 5-14

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