São Paulo, quarta-feira, 12 de fevereiro de 1997
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Questão de miopia

SÉRGIO MAUAD

Desemprego, globalização da economia e reorganização empresarial são termos hoje muito em voga. Analisados por sociólogos, certamente têm um enfoque muito diferente de quando são analisados pelos economistas mentores de planos econômicos. Até porque sociólogos, por natureza, vêem as coisas sob o enfoque do bem-estar social, do homem na sua plenitude. Digamos, fazem uma análise humana.
Os economistas, por sua formação, olham pelo enfoque inerente à sua especialização, o econômico, que é, em essência, humano. Estes, no entanto, quando no governo, parece que passam a ver como míopes, apenas de perto, e enxergam só o orçamento que está sobre suas mesas. O que está longe de Brasília, o povo, eles parecem não ver nem de binóculo.
No melhor dos mundos, imagine o leitor se esses economistas trocassem idéias com os sociólogos constantemente. O resultado talvez fosse algo maravilhoso. Mas, reconheçamos, estamos imaginando um belíssimo filme de ficção, colorido e em três dimensões, bom demais para um Brasil que vive seu sétimo plano econômico.
Trabalhamos num setor, o imobiliário, que nos coloca num privilegiado ponto de observação e em contato com o trabalhador simples, a maioria de baixa qualificação profissional e que constrói o mais cobiçado bem que o homem quer ter: sua casa.
Essa produção tem um poder reprodutor extraordinário na economia e contribui em 7% no PIB, historicamente como construção civil. No caso da política habitacional, à maioria dos "econocratas" está-se somando uma catarata, a ponto de não enxergarem a obviedade, paralisando a produção imobiliária.
A política habitacional é de competência do Ministério do Planejamento, muito sufocado, como os demais ministérios, pelo da Fazenda, que defende a qualquer custo o Plano Real -justiça seja feita, muito bem conduzido até agora com o controle da famigerada inflação. Só que esta primeira etapa do Plano está feita. Os demais ministérios precisam de mais espaço para subsidiar a política do país como um todo. São eles que ouvem as particularidades de cada setor, conhecem suas necessidades e têm como contribuir para um crescimento sustentado.
Até agora, o governo anunciou medidas no mínimo insuficientes e, algumas delas, bastante questionáveis, como solução para carrear recursos à produção e ao mercado imobiliário. As tímidas cartas de crédito, por exemplo, em número irrisório, não têm como contrapartida um estímulo à produção imobiliária.
Aliás, temos ouvido nossas autoridades monetárias falando repetidamente nos descontos de recebíveis como solução para o setor. E será mesmo, um dia, quando, além da inflação controlada, tivermos a confiabilidade política, tão esperada pelos investidores estrangeiros, e estivermos vivendo o esperado desenvolvimento sustentado, que não prescinde de uma construção imobiliária altamente profissionalizada e ativa. Isto, é claro, com as reformas estruturais feitas: a previdenciária, a administrativa e a tributária.
O que se esquece de dizer é que, para descontar recebíveis, é preciso ter a construção pronta. Mas com que recursos? Apenas esboça-se um início desse tipo de operação para recursos à produção, ainda incipientes.
O que se espera de nossos governantes é que atendam à sugestão do setor, que o Secovi-SP, juntamente com outras entidades de classe, tem insistentemente apregoado: reduzam o compulsório da poupança de 15% para o que já era, 10%, e cerca de R$ 2,5 bilhões se somarão ao SFH para agilizar a produção.
Isso contribuirá para amenizar o acentuado desemprego que assola a nação, manterá algum ritmo de produção, inclusive para atender ao programa de cartas de crédito concedidas aos cidadãos interessados, tão alardeado pelo governo e que, na verdade, não sai do papel, a não ser nuns poucos e tímidos casos concretos. Claro, para usar a carta de crédito tem de haver casa construída.
Mais do que isso, é preciso manter ativas as empresas nacionais que estão incorporando tecnologias avançadas, já reduziram em muito os seus custos e começam a concorrer com empresas estrangeiras, que, logo mais, trarão ao país dinheiro a taxas de juros muito baixas.

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