São Paulo, quarta-feira, 12 de fevereiro de 1997
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Retórica inútil

ANTONIO DELFIM NETTO

O governo gasta inutilmente o seu latim quando tenta defender a excessiva sobrevalorização cambial realizada no início do Plano Real pretendendo mostrar que essa é uma prática moderna.
É certo que ela tranquiliza banqueiros e especuladores, mas não é menos certo que ela impõe custos desnecessários às atividades produtivas e ao nível de emprego.
Com o câmbio valorizado as empresas exportadoras tentam reduzir os seus custos por meio da pressão sobre os preços dos seus insumos e aumento de produtividade e, quando não têm sucesso, fecham as suas portas, aumentando o contingente de desempregados e produzindo um desperdício de talento empresarial e capital.
Um dos grandes mitos que ocupam hoje o noticiário é que o câmbio valorizado produz, necessariamente, um aumento da produtividade capaz de autocorrigi-lo. Se uma empresa estava exportando ao nível de câmbio real que prevalecia antes do Plano Real, ela poderá continuar a fazê-lo se sua margem de lucro era maior do que a valorização ou se, mesmo depois dela, o preço exportado continuar a cobrir os custos variáveis, mas isso significa que ela estará "exportando" uma parte do seu capital junto com o seu produto.
O "aperto" cambial pode ser certamente superado, no caso de uma empresa, com mudança de tecnologia (o que significa mais investimento numa atividade pouco rentável) ou por uma redução dos preços dos insumos.
O câmbio valorizado (e as baixas de tarifas e o crédito externo a taxa de juros internacional e longo prazo) reduzem o custo dos insumos importados, mas numa proporção pequena, dependendo da penetração das importações no setor.
O que corrige, de fato, a sobrevalorização é a redução do salário nominal que produz uma deflação de preços. Mas isso só pode ser obtido à custa de muito desemprego e de um longo período em que os preços internos crescessem menos do que os externos.
Essa é, afinal, a lógica da "desinflação competitiva" em que está metida a França há dez anos. Em 1996 o seu desempenho continuou medíocre, como se vê na posição dos países que constituem o Grupo dos 7, relacionados na tabela:
Boa parte desses resultados é coincidência dos ciclos dos países (com exceção dos EUA e Inglaterra, que estão em pontos diferentes do ciclo). Mas é inegável que a taxa de crescimento da França era maior: 2,5% ao ano no período 1978/89 (contra 2,1% da Alemanha). Entre 1991 e 1996, essa taxa reduziu-se a 1,1% ao ano, contra 3,4% ao ano no período 1987/90!
Os países que se libertaram dos constrangimentos impostos pela fixação do câmbio com relação ao marco (Inglaterra e Itália), para não falar em Suécia, Finlândia e Espanha, fizeram a transição para menores taxas de inflação com custos inferiores em matéria de emprego e Produto Interno Bruto.

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