São Paulo, sexta-feira, 28 de fevereiro de 1997
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Prefeitura já investigou Ramos em 88

MARCIO AITH e ANA MARIA MANDIM

MARCIO AITH; ANA MARIA MANDIM
DA REPORTAGEM LOCAL

Antes de envolver-se no escândalo dos precatórios, Wagner Baptista Ramos, coordenador da Dívida Pública do município de São Paulo, foi citado em 1988 como um dos personagens em operação suspeita com títulos da prefeitura.
O caso ocorreu na gestão do prefeito Jânio Quadros (86-88) e causou prejuízo de R$ 829 mil (valores corrigidos) ao Iprem (Instituto de Previdência do Município).
A operação guarda notável semelhança com negociações sob investigação do BC realizadas pelo ex-secretário municipal das Finanças e atual prefeito, Celso Pitta.
Por ordem escrita de Jânio, o Iprem comprou da BRB DTVM, corretora do Banco Regional de Brasília, R$ 11,6 milhões em OTMs (Obrigações do Tesouro Municipal) ao preço unitário de R$ 21,66, sempre em valores corrigidos.
Seria uma transação corriqueira não tivessem os mesmos títulos sido adquiridos da prefeitura, no mesmo dia, pela BRB, ao preço unitário de R$ 20,12.
Enquanto secretário das Finanças, Pitta vendeu e recomprou no mesmo dia LFTM (Letras Financeiras do Tesouro Municipal) com perda de R$ 1,7 milhão -contestada por ele- para o município.
"Novidade"
A compra das OTMs pelo Iprem motivou a abertura de inquérito administrativo em 1988, e Ramos foi um dos chamados a depor para explicar a operação.
Ele havia ingressado na Secretaria das Finanças cinco meses antes e era encarregado da emissão dos títulos da prefeitura, segundo o então secretário, Carlos Alberto Manhães Barreto.
Manhães, citado no inquérito como um dos responsáveis, disse ontem à Folha que não se lembra bem de Ramos e que não sabia da existência da investigação. "Isso tudo é novidade para mim."
Segundo a Folha apurou, Jânio foi alertado por diretores do instituto de previdência que estranharam a diferença de preço.
Manhães saiu da prefeitura em 16 de agosto de 1988 por motivo de saúde. Iniciado três dias depois, por ordem do próprio Jânio, o inquérito caminhou pelo menos até 93. Até agora ninguém foi punido.
Ramos não sofreu penalidade administrativa por ser funcionário celetista. Caso fosse comprovada irregularidade, bastaria demiti-lo, o que não ocorreu, por razões desconhecidas.
Manhães não depôs; Ramos, sim. Argumentou que a diferença entre os valores havia sido creditada ao Fundo de Liquidez do município. Segundo ele, a BRB, por contrato, operava com a prefeitura, e, por isso, o lucro seria devolvidos aos cofres públicos.
Os encarregados do inquérito não aceitaram o argumento porque não foi apresentada prova documental do retorno do dinheiro. Além disso, o Iprem havia assumido todo o prejuízo.
Convite do PT
Apesar do precedente do inquérito administrativo, facilmente localizável sob o nº 08-001.012/88*35, a carreira de Ramos na prefeitura prosseguiu sem atropelos durante 11 anos. Ontem foi demitido.
Quando Luiza Erundina assumiu a prefeitura, em 1989, Ramos foi um dos poucos funcionários da gestão anterior convidados a permanecer no posto. Ele já assumira informalmente a função de Coordenador da Dívida Pública.
"Era pessoa simples, muito trabalhadora, dedicada", afirma Amir Khair, secretário das Finanças de Erundina. "Era o único com conhecimento de detalhes da burocracia de emissão de títulos."
Durante a gestão do prefeito Paulo Maluf (93-96), Ramos tornou-se oficialmente Coordenador da Dívida Pública, sob o comando do então secretário Celso Pitta.
Chamado de "diretor", era o principal representante da prefeitura nos leilões de títulos.
O sucessor de Pitta, José Antonio de Freitas, diz que sabia que Ramos prestava assessoria a outros governos para emitir títulos, mas "a título de colaboração".
Nos leilões de títulos municipais realizados em 1994, Ramos era o principal representante da prefeitura. Ele era o responsável pelo "corte das propostas" -decisão pela qual se fixam limites de preço para compra e venda dos papéis.

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