São Paulo, sexta-feira, 28 de fevereiro de 1997
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Teve óleo na engrenagem burocrática dos prêmios

JOÃO MARCELLO BÔSCOLI
ESPECIAL PARA A FOLHA

O Grammy é um evento difícil de realizar. Por ser uma premiação acadêmica, com os discursos, apresentadores e piadas de sempre, tende a ser previsível e cansativo. Como antídoto para isso, os americanos usam um patrimônio cultuado desde o jardim da infância: o entretenimento. Música e dança são usadas pelos organizadores como óleo na engrenagem burocrática de prêmios.
Para quem se apresenta é uma fogueira. Está ao vivo para mais de um bilhão de pessoas, com marcações de palco para iluminação e câmeras, tempo pré-estabelecido e uma platéia com Stevie Wonder, Quincy Jones e Aretha Franklin, entre dezenas de outros. São doses industriais de vaidade.
Houve vários momentos competentes: Natalie Cole e Herbie Hancock fazendo um tributo à deusa Ella Fitzgerald; Beck demonstrando a diferença vocal entre brancos e negros; Fugges fazendo um tributo ao eterno Bob Marley.
Gente como Wayne Shorter, Michael Bracker, Rage Against the Machine, Babyface e Smashing Pumpkins mais do que merece o Grammy. Sheryl Crow e Celine Dion dão saudades de Whitney Houston.
Os brasileiros são obviamente vitoriosos pelas indicações. Especialmente Ivan Lins e Moogie Canazio. O primeiro por ser um dos compositores brasileiros mais respeitados de todos os tempos na América; o segundo por se tornar dia a dia nosso engenheiro mais importante no exterior.
Moogie "perdeu" para uma equipe chefiada por Bruce Sweden, seu amigo e professor, considerado um dos melhores do século 20 e com 25 anos a mais de idade.
Para encerrar, gostaria de falar sobre o discurso de Steve X., presidente da NARAS. Atacou os políticos, evocou a primeira emenda, falou em "liberdade", "acervo", "responsabilidade", "educação musical".
Foi um dos únicos momentos políticos da noite. O pronunciamento cai como uma luva para o Brasil, um país com doses baixíssimas de inteligência política. Apesar de sermos o sexto mercado mundial de música, ainda somos o primeiro em desperdício cultural.
Lembrei uma frase interessante, de origem desconhecida, que diz ser o Brasil um país com todos os recursos em si, mas apenas sem consciência disso. Logo, não é um país doente, é um país bêbado. Que Dionísio nos ajude!

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