São Paulo, quarta-feira, 5 de março de 1997
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Che-Guevara

CATHERINE BÉDARIDA
DO "LE MONDE"

Há quase 30 anos, no dia 9 de outubro de 1967, Ernesto "Che" Guevara foi executado por militares bolivianos, assessorados pela CIA. A memória do guerrilheiro argentino, figura mítica para a juventude dos anos 70, é celebrada por livros, discos e, dentro em breve, também por filmes.
O recém-lançado CD "El Che Vive, 1967-1997", que contém uma antologia de músicos sul-americanos, puxa as homenagens na França. Ao mesmo tempo estão saindo novas versões de "Hasta Siempre", o hino escrito pelo cubano Carlos Puebla.
No cinema, Michael Radford, que dirigiu "O Carteiro e o Poeta", está trabalhando num projeto de filme sobre os últimos momentos de vida de Che Guevara.
Ainda na França, Maurice Dugowson conclui a montagem de um documentário biográfico. Outros cineastas também estão pensando em fazer filmes sobre Guevara. Na Bolívia, o Ministério do Turismo pretende inaugurar, neste ano, um circuito chamado "A rota de Che".
Aniversário da morte
Camisetas, pôsteres e broches com a foto de Guevara começaram a ser vendidos ainda em 1968.
Com a chegada do 30º aniversário de sua morte, os produtos inspirados em Che se multiplicam pelo mundo todo: de um CD single até um filme da Warner, do fã amador à máquina de Hollywood, da abordagem mistificadora ao documentário biográfico.
O que não falta são admiradores de Che. Alguns veneram o guerrilheiro morto como se fosse Cristo ou um astro pop, outros apenas se divertem com a história toda e ainda outros continuam falando em combater os imperialismos.
"Aqui resta a clara, a profunda transparência de tua presença amada, comandante Che Guevara. Continuaremos sempre, como continuamos a teu lado hoje, e com Fidel te dizemos: Até sempre, comandante!"
"Hasta Siempre", a canção escrita pelo cubano Carlos Puebla depois da morte de Che, com música composta seguindo receita análoga à de outros sucessos na ilha, como "Guantanamera", já percorreu o mundo. Sua letra exprime culto absoluto ao ídolo:
"Tua mão gloriosa e forte dispara sobre a história. Teu amor revolucionário te conduz a novas conquistas, que esperam pela firmeza de teu braço libertário".
Esse fervor se explica, em parte, pela brutalidade do assassinato de Che. E "Hasta Siempre" se popularizou em países onde nem sequer se fala espanhol.
Na França, os loucos por Guevara encontram pelo menos uma dúzia de versões recentes diferentes do hino. A original está no CD "El Che Vive, 1967-1997".
Produzido pelo selo parisiense Last Call, o disco vem tendo vendas boas. Um trecho de um discurso de Che Guevara e 15 canções, em sua maioria compostas e interpretadas por músicos latino-americanos, formam uma espécie de antologia das homenagens musicais ao "guerrilheiro heróico".
Cristo leigo
O diretor de TV e cinema Maurice Dugowson está montando seu documentário para que esteja pronto até outubro, 30º aniversário da morte de Guevara. Baseado na biografia escrita por Pierre Kalfon, a ser lançada em breve, seu filme trata da vida inteira de Che, do nascimento ao mito.
"O homem é político; a imagem, romântica. Che, uma espécie de Cristo leigo, me fascina. Esse jovem argentino, tão belo que poderia ter sido ator, se presta a um personagem puro", diz o cineasta.
Ettore Scola, na Itália, Michael Radford, na Inglaterra, Dimitri De Clerq, co-produtor, com Alain Robbe-Grillet, de "Un Bruit Qui Rend Fou", e vários cineastas latino-americanos também têm projetos de filmes sobre Guevara, que se encontram em fases mais ou menos adiantadas de produção.
Desde a morte de Che Guevara, a América do Sul gerou outros personagens fortes, outros movimentos sociais que chamaram a atenção do mundo, entre eles as Mães da Praça de Maio, na Argentina, o Movimento dos Sem-Terra, no Brasil, o Prêmio Nobel da Paz dado à guatemalteca Rigoberta Menchu -mas nenhum parece tão comercializável quanto Guevara.
Os produtos "Che" oferecem um caráter inofensivo de rebelião e exotismo. O guerrilheiro heróico virou comandante anestesiado.
Quem foi Guevara
Ainda não foi escrita uma biografia confiável de Ernesto Guevara de La Serna. À medida que os dignitários cubanos foram abandonando o regime ao qual serviram, foram fazendo revelações. Mas falta um trabalho de pesquisa sério, que lance luz sobre a vida real dessa lenda Che Guevara.
14 de junho de 1928. Guevara nasce em Rosário, Argentina, filho de uma família pequeno-burguesa abastada.
1947. Decide estudar medicina.
1955. Conhece Fidel Castro.
1º de janeiro de 1959. Liderados por Guevara, os guerrilheiros castristas entram em Havana. Até 1965, Che ocupa vários cargos de primeiro escalão no governo Fidel.
1965. Che rompe com a URSS, que vai, pouco a pouco, abandonar os movimentos guerrilheiros na América Latina.
9 de outubro de 1967. Che é executado na Bolívia, onde tentava, em vão, fomentar um novo movimento guerrilheiro.

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