São Paulo, sábado, 8 de março de 1997
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MST vai usar a violência em conflitos em São Paulo

FÁBIO ZANINI*

FÁBIO ZANINI; LUIS HENRIQUE AMARAL; EDMILSON ZANETTI; FRANCISCO CÂMPERA
DA AGÊNCIA FOLHA, NO ABCD

Direção dos sem-terra diz que armas não serão empregadas

LUIS HENRIQUE AMARAL
O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) anunciou ontem que reagirá com violência caso seus integrantes sejam recebidos a tiros durante invasões de fazendas.
"A gente cansou de ser frouxo", disse Gilmar Mauro, da direção nacional da entidade.
A decisão, em princípio, só se aplica ao Estado de São Paulo. Ela foi anunciada ontem, no final do 12º Encontro Estadual do MST.
A proposta foi apresentada pelos representantes dos acampamentos e assentamentos do Pontal do Paranapanema (oeste de São Paulo) e aprovada pela maioria.
"Nós sempre fomos muito pacientes, mas a paciência já se esgotou. Não vamos mais aceitar passivamente a parcialidade da Justiça e as arbitrariedades da PM, que acha que tem o direito de entrar nos acampamentos quando bem entender", afirmou Mauro.
"Da próxima vez, o povo vai pegar na unha", disse o dirigente. Segundo Mauro, os sem-terra não vão se armar. "Mas não podemos mais impedir que os companheiros reajam à violência", disse.
A decisão foi tomada, segundo a liderança, depois que a direção foi fortemente pressionada pela base. "A companheirada não aceita mais ser humilhada por juiz, delegado ou jagunço", disse.
O encontro do MST paulista durou três dias e acabou ontem. Ele foi realizado em um ginásio cedido pela Prefeitura de Santo André (região metropolitana de São Paulo).
A mudança na estratégia do MST paulista foi gerada pelo incidente acontecido no dia 16 fevereiro, quando sem-terra foram feridos a bala durante invasão a uma fazenda na região do Pontal.
Além disso, a Justiça determinou a prisão de cinco líderes dos sem-terra na região. Apenas um está preso, Márcio Barreto. Os demais encontram-se foragidos.
Violência
O dirigente disse que "tem consciência" que uma eventual radicalização da posição do MST pode gerar mais violência no Pontal.
"Pode ser (que haja mais violência), apesar de nós continuarmos a pedir soluções pacíficas. Mas existe violência maior que a de uma família que passa fome, ou a de um pai que tem de fugir e se afastar dos filhos?", diz Mauro, se referindo aos dirigentes que estão foragidos.
A fundamentação do líder do MST tem um caráter quase "romântico": "É melhor morrer lutando de pé do que de fome".
Além de permitir a reação aos ataques dos fazendeiros, o MST paulista decidiu "massificar" as invasões. "Seremos milhares contra meia dúzia de jagunços e fazendeiros", afirmou.
Governo e UDR
O presidente da UDR (União Democrática Ruralista), Roosevelt Roque dos Santos, disse que a disposição do MST vai levar ao agravamento do conflito, já que "os fazendeiros vão continuar exercendo o direito constitucional de se defender".
"Este é o receio dos fazendeiros: o crime de turba. Como controlar 1.500 pessoas numa invasão?", disse, referindo-se ao número de pessoas que tentaram invadir a fazenda São Domingos, em que seis sem-terra saíram feridos a tiros.
Disse esperar que "as autoridades tomem medidas contra quem incita a prática do crime".
Para o secretário-adjunto de Justiça de São Paulo, Edson Vismona, o MST vai ter de "responder à Justiça pelas consequências" de sua decisão de reagir com violência à ação dos fazendeiros.
O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Yussef Cahali, não se manifestou sobre o assunto.

Colaboraram Edmilson Zanetti, da Agência Folha, e Francisco Câmpera, free-lance para a Folha

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