São Paulo, sábado, 8 de março de 1997
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Livro visita a alcova de Pablo Picasso

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

O pintor andaluz Pablo Ruiz Picasso (1881-1973) já virou mesmo um popstar. Por que, então, não o tratar literalmente assim, às claras, sem os rigores da academia?
É o que parece pensar Carlos von Schmidt, crítico de arte, 67 anos, curador da Bienal Internacional de São Paulo em 1979, um longo rabo-de-cavalo grisalho.
Ele acaba de escrever o livro "Na Cama com Picasso", que tem 144 páginas e 30 capítulos curtos. O lançamento está previsto para o dia 27, no Museu Brasileiro de Escultura, zona sul paulistana.
O título do trabalho, dispensável dizer, tira uma casquinha de "Na Cama com Madonna", o documentário de 1990 que prometia desnudar a já desinibida cantora e atriz norte-americana (mostrava-a, por exemplo, simulando sexo oral em uma garrafa).
O livro de Schmidt segue trilha parecida. Concentra-se, basicamente, na alcova de Picasso. Pretende jogar luz sobre os principais casos amorosos do pintor e demonstrar como interferiram em tudo o que o espanhol produziu.
Não defende nenhuma tese espetacular. "Quero provar apenas que a vida e a obra do artista andaram juntas", define o autor, à vontade com o lugar-comum.
"Como Madonna, Picasso adorava se exibir", prossegue. "Cultivava o marketing sexual. Era o arauto das próprias performances, que contava em detalhes nos bares, brasseries e restaurantes."
Para Schmidt, o livro poderia se chamar "Os Lençóis de Picasso". Para a dramaturga Maria Adelaide Amaral, que assina o prefácio, outro título de inspiração cinematográfica também lhe cairia bem: "O Que Você Gostaria de Saber sobre Picasso, mas Tem Medo de Perguntar".
Tanta atenção à intimidade do pintor não acaba banalizando o gênio, como ocorreu no recente filme de James Ivory, "Os Amores de Picasso"?
Schmidt se confessa despreocupado com a questão -e o prova mais uma vez. Caminha até a estante próxima e saca dali a capa do livro, ainda inacabada.
Vê-se, então, a foto de uma jovem na cama, usando camisolinha e desfiando um olhar de tédio.
Para conceber o volume, que sairá com tiragem de 1.500 exemplares e custará R$ 25, Schmidt se apoiou em uma bibliografia de 40 títulos.
A lista contempla raridades como "Picasso", que Gertrude Stein publicou há quase 60 anos.
Também inclui obras indispensáveis para quem deseja conhecer o pintor. As principais: "Le Siècle de Picasso" (Pierre Cabanne, 1975), "Picasso Creator and Destroyer" (Arianna Huffington, 1988) e "A Life of Picasso" (John Richardson, volume 1, 1991).
Praticamente tudo o que Schmidt aborda vem dos 40 títulos. "Na Cama com Picasso", portanto, não traz informações novas. Escrito coloquialmente, à moda das crônicas, o livro traça o perfil das sete mulheres com quem o artista manteve relações duradouras (leia quadro abaixo).
Mas há páginas dedicadas às amantes ocasionais -aquelas duas ou três mocinhas que, reza a lenda, o "minotauro de Málaga" costumava devorar por dia.
A acrobata Nush Éluard é uma delas. Loira de olhos azuis, dividia-se entre o leito do marido (o poeta Paul Éluard) e o de Picasso.
O livro destaca, ainda, uma faceta obscura do artista e rejeitada por biógrafos como John Richardson: o dom Juan compulsivo teria se envolvido com homens, principalmente durante a juventude.
Esmiuça-se, entre outros, o caso de um cigano que o pintor conheceu num vilarejo espanhol em 1898, enquanto convalescia de escarlatina (leia trecho à direita).
O autor encerra o volume com uma carta de intenções, esclarecendo por que o escreveu: "Este livro não é e não pretende ser um estudo da obra picassiana. Longe disso! É uma biografia interpretativa não autorizada".
A biografia, porém, se ressente da falta de ilustrações. Não há nenhuma ao longo das 144 páginas. Explica-se: as duas pequenas editoras do livro (a Artes e a Digital) não tiveram condições de pagar os direitos de reprodução.

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