São Paulo, sábado, 8 de março de 1997
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Julio Bressane faz cinema de idéias em "Alguns"

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os textos reunidos no pequeno volume "Alguns" (Imago) comprovam o que já se sabia: Julio Bressane é nosso cineasta intelectualmente mais bem-dotado.
São artigos, reflexões, esboços de ensaios sobre música popular, literatura, filosofia, cinema. Mas não uma dessas coisas de cada vez: tudo ao mesmo tempo agora.
Bressane pode começar um texto em José Lewgoy e terminar em Ezra Pound, passar de Vassourinha a Mallarmé, misturar Noel Rosa e São Jerônimo.
Essa profusão de aproximações insólitas é a consequência lógica de uma inteligência que concebe o cinema como "um organismo intelectual demasiadamente sensível que faz fronteira com todas as artes, ciências e... a vida".
O que Bressane busca compreender e exaltar, em toda criação do espírito, é a experiência da transgressão dos limites: a música que quer ser pintura, o cinema que quer ser música, o pensamento que quer ser poesia.
Algumas figuras (ou "signos", como gosta de dizer) são centrais e recorrentes nesse processo: Vieira, São Jerônimo, Machado de Assis, Mario Peixoto, Mario Reis.
Nem todos os textos do volume trazem o mesmo nível de empenho analítico e clareza de exposição.
Entre caprichos como o sóbrio "O Signo Jerônimo", despontam relaxos como "Vassourinha: Ulisses na Record", pouco mais que uma colagem de trocadilhos de inspiração oswaldiana.
A esse ocasional desdém superior do artista (que o leva a transformar, por exemplo, o cineasta-mascate libanês Benjamin Abraão no "sírio Abraão Jacó"), vem-se juntar um desleixo editorial: o livro está repleto de erros de revisão, sobretudo nos nomes próprios e nos títulos de obras.
Mas vale a pena ler Bressane, que em seus melhores momentos faz a poesia que queria Pound: conversa entre homens inteligentes.

Livro: Alguns
Autor: Julio Bressane
Preço: R$ 10 (95 págs.)

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