São Paulo, domingo, 9 de março de 1997 |
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Brecha na lei facilita fraude em atestado
ROGERIO SCHLEGEL
Nem todo o caminho do corpo e respectivas providências burocráticas são claramente descritos em lei. Para complicar, órgãos encarregados da fiscalização têm estrutura incapaz de reprimir o descumprimento da legislação. "Temos só 20 fiscais, que cuidam de todos os velórios, cemitérios e funerárias que atuam em São Paulo. Não dá para pegar tudo", afirma o superintendente do Serviço Funerário Municipal da capital, Ignazio Gandolfo. O órgão sabe que funerárias de outras cidades fazem enterros na capital, o que é proibido. "Tentamos reprimir, mas você acaba com o assédio às famílias dos mortos que existe na porta de um hospital em um dia e eles voltam no dia seguinte", afirma. Gandolfo diz que a maior desorganização na área foi instalada pela lei estadual 9.055, de dezembro de 1994. Até então, havia uma lei estadual que regulava o transporte de cadáveres e outra municipal que exigia pedido formal da cidade destino do corpo. "A lei 9.055 é omissa sobre o transporte intermunicipal, o que permitiu às funerárias alegarem que as exigências da municipal perderam a validade", diz. "Hoje não há mais controle do destino." O superintendente afirma que há funerárias que atuam na capital com atestados de óbito "arranjados" em outro município. Falsidade ideológica O rigor com os atestados de óbito também é apenas teórico. Em tese, mesmo um médico que acompanhe o paciente não pode emiti-lo se houver morte natural, mas a provável causa mortis não tiver sido diagnosticada anteriormente. O médico da família não deveria dar o atestado para uma paciente que sofra de câncer, mas pareça ter morrido de infarto, por exemplo. "Não é isso que acontece", afirma um delegado seccional da Grande São Paulo. "As famílias de mais posses dão um jeitinho de um médico conhecido passar o atestado e assim evitam a autópsia." Segundo Francisco Claro, diretor do Instituto Médico Legal (IML) do Estado, seria preciso exumar o corpo para que a informação atestada pelo médico fosse checada, o que só é viável no caso de haver uma suspeita específica. No limite, o médico que dá um atestado sem estar certo da causa da morte pode até estar escondendo um assassinato -por envenenamento, por exemplo. O Conselho Regional de Medicina informou que não tem como controlar a veracidade dos atestados. O médico que falseia informações pode perder o diploma e, se condenado por falsidade ideológica, pegar até cinco anos de prisão. Cabe à Polícia Civil fazer a triagem entre mortes naturais e violentas. Se não há sinais visíveis de violência, ele é encaminhado ao Serviço de Verificação de Óbitos (SVO), que faz a autópsia. Segundo Carlos Augusto Pasqualucci, vice-diretor do SVO, o serviço não suspende a autópsia se aparece atestado de óbito depois do encaminhamento. "Só com contra-ordem policial", diz. Pasqualucci afirma que a medida -uma precaução do SVO para evitar fraudes- não está prevista na legislação. Texto Anterior: Obra da Sabesp deixa 1,4 milhão sem água Próximo Texto: Sociedade se une e reforma cadeia em MG Índice |
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