São Paulo, sexta-feira, 14 de março de 1997 |
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Contra o massacre dos futuros campeões
ROBERTO TRINDADE
O Grand Slam reúne os quatro torneios de tênis mais difíceis e de maior prestígio em todo o mundo. Martina Hingis, a dona da proeza no último mês de janeiro, nasceu na Tcheco-Eslováquia e joga desde os 3 anos, reinada por sua mãe, uma ex-tenista. Agora, a jovem suíça está muito perto de se tornar a primeira colocada no ranking mundial, desbancando a alemã Steffi Graf. O acontecimento e as notícias publicadas em jornais chamaram minha atenção. Também parece ser necessário chamar a atenção para o intenso treinamento físico ao qual são submetidas certas crianças e adolescentes. É evidente que não estou discutindo a importância da prática esportiva para o crescimento e o desenvolvimento integral delas. O que eu desejo alertar é que, com desejo de criar futuros campeões, desenvolveu-se, no mundo inteiro, uma mentalidade esportiva voltada para um treinamento precoce. Essa "overdose" é caracterizada por treinos de até 3 ou 4 horas diárias. Isso sem contarmos o tempo adicional da duração das competições. Considerações de ordem política, econômica e social foram a origem da criação e desenvolvimento dessa modalidade de treinamento. A preocupação inicial não leva em conta a criança, com todas as suas particularidades e idiossincrasias: fase de desenvolvimento, organismo, metabolismo, sua psicologia. Só a obtenção de resultados. E, assim, crianças e adolescentes são massacrados: abuso atlético aprovado, e incentivado, pela sociedade. Precisamos estar atentos para esse abuso. E necessitamos alertar os pais. Numerosos casos de traumatologia, causados por excesso de treino, vêm provocando invalidez por períodos de relativa importância. Também temos assistido a outros acidentes, que envolvem a saúde mental. Não podemos ser negligentes ou fechar os olhos para os fatos. Lembrem-se de que crianças afetiva e psicologicamente imaturas estão sendo engajadas precocemente num caminho que leva ao vedetismo, sinônimo de fracasso para a grande maioria. Afinal, para haver vencedores é necessário que alguém saia perdedor. Está a criança habilitada para entender esse regra de equilíbrio? Nadadores, jogadores de vôlei e basquete, judocas, tenistas e ginastas infantis são obrigados, pelo desejo de pais e técnicos, a viver em função da conquista de uma medalha. Será que o prestígio que nos traz uma medalha, seja ele para um clube, uma equipe ou uma nação, merece que sejam postos em jogo a infância e a saúde de numerosos jovens? Não seria a hora de educadores, atletas, pais e toda a sociedade avaliarem o que está acontecendo e o que pretendem para o futuro? Será que o assunto não merece um pouco mais de atenção e reflexão de cada um de nós? Texto Anterior: Rei Ronaldo Próximo Texto: Família Índice |
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