São Paulo, domingo, 23 de março de 1997
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Time exibe sua valentia pelo sertão

MÁRIO MAGALHÃES
ENVIADO ESPECIAL A SERRA TALHADA (PE)

O Serrano, time de Serra Talhada (PE), estava em apuros no ano passado. Jogando em casa, no estádio Pereirão, seus jogadores se envolveram numa confusão com os adversários, de Surubim (PE).
Os oponentes, embora não tivessem sofrido um arranhão, prometeram recepção violenta no returno da segunda divisão do Campeonato Pernambucano.
Fosse de outro lugar, o Serrano teria pedido proteção policial e ajuda da federação.
Mas o clube comportou-se de forma ortodoxa: cada jogador viajou carregando um revólver, na maioria calibre 38.
No total, eram mais de 20 armas. Com a história espalhada, a equipe passou incólume por jogadores, torcedores e bandos de assaltantes que atacam ônibus pelo sertão.
A coragem, fora de campo, e a garra, dentro dele, são componentes da herança cultural do maior fenômeno social da história da cidade -o cangaço- e do seu grande protagonista: Virgolino Ferreira, o Lampião.
Pistoleiro
O zagueiro Carlos Alberto Bezerra, o Boi, é o paradigma da valentia dos atletas do Serrano.
Primo de Lampião -seu avô, Massá Ferreira, era primo-irmão do Rei do Cangaço-, com pouco mais de 1,60 m de altura, Boi é um gigante a impor respeito.
Não pelo estilo elegante, de passes corretos, que lembram o líbero italiano Baresi, mas pelas histórias contadas a cada esquina da cidade, por seus companheiros de time, amigos e inimigos.
Boi não ganharia a vida com os R$ 112 que recebe do clube, mas com uma das mais tradicionais profissões locais: pistoleiro, matador de aluguel.
Ele nega, embora já tenha sido preso e, numa briga de família como a que originou o bando de Lampião, sequestrado.
"Não sei nem atirar", diz ele, às gargalhadas, antes de afirmar: "Esse negócio de briga eu já trago de família".
No Fórum de Serra Talhada, corre um processo (064/87) em que ele é acusado de matar a tiros José Mauré da Silva, em 1987.
Boi ganhou o apelido nos tempos em que trabalhava como vaqueiro. Também já foi agiota. "Mas agora larguei."
Erra quem folcloriza o futebol local como violento -nos gramados, seus atletas não batem mais do que a média. Mas, fora, vivem a barra-pesada de Serra Talhada.
O volante Tinha, que treinava como titular, fugiu da cidade há semanas. Um policial disse que o jogador foi embora depois de levar uma surra da polícia.
Na dúvida, Tinha achou melhor desfalcar o time e esperar que o clima fique mais ameno.

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