São Paulo, domingo, 23 de março de 1997
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SACRIFÍCIO DA INFÂNCIA

Parece razoável pensar que é preferível um trabalhador infantil a um menino de rua desocupado ou precocemente criminoso. Mas esse raciocínio, tantas vezes um elogio ao sacrifício infantil -"Ele trabalha e estuda!"-, na verdade revela um certo descaso com o futuro da cidadania.
Pesquisa divulgada pelo Dieese mostra que até 74% das crianças trabalhadoras das capitais brasileiras já foram reprovadas na escola alguma vez. Em média, a taxa geral dos que já repetiram o ano é de cerca de 20%.
Num país pobre como o Brasil é aceito como inevitável que um garoto em idade escolar complete o orçamento familiar com poucas dezenas de reais ganhos em subempregos.
Pode-se argumentar que o país dificilmente teria de onde tirar recursos para resolver de uma hora para outra o problema desses 5 milhões de menores de 14 anos que trabalham.
Em Pernambuco, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil do governo federal vai gastar, em 1997, R$ 1.200 por criança para fazer com que elas deixem o trabalho num canavial e passem a estudar. Isto é, numa conta grosseira, seriam necessários R$ 6 bilhões anuais para resolver o problema em todo o país.
Esse valor talvez possa ser reduzido. Em regiões mais ricas e com melhor rede escolar, os gastos seriam menores que os de Pernambuco.
O atendimento escolar integral (com jornada de estudo maior e alimentação) também colaboraria para abater a despesa familiar e ajudar a levar as crianças para a escola. A participação comunitária na adoção de trabalhadores infantis seria outro modo de combater o problema.
Mas, por fim, é preciso avaliar melhor o que significa o "custo" desses programas. Um exemplo: quanto custa a repetência? Não tomar medidas para resolver o problema vai provocar um prejuízo ainda maior, para o país e para cada cidadão: a desqualificação profissional, cultural e política dos que não puderam frequentar a escola com proveito por causa da necessidade precoce de trabalhar.

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