São Paulo, domingo, 23 de março de 1997
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Sou seu fã

MARCELO MANSFIELD
ESPECIAL PARA A FOLHA

O velho e confiável Aurélio já diz: "Fã, abreviatura do inglês-americano 'Fanatic' ...admirador exaltado de certo artista de rádio, cinema, televisão...".
Para a indústria do show business, no entanto, o fã tem importância vital. Sem ele, não existe o ídolo, não existiriam as centenas de cartas que elevam garotinhos de praia a protagonistas, e, sem dúvida, Emilinha Borba e Marlene já não estariam na ativa.
Nos tempos do rádio, as garotas ficavam aos berros do lado de lá do muro das emissoras esperando pacientemente um pouco de atenção de seus ídolos.
Com Cauby Peixoto, surgiram as "macacas de auditório", que gritavam tão alto que mal se ouvia a potente voz do cantor -além de transformarem suas roupas em panos de chão... Dizem que Cauby usava roupas só alinhavadas para facilitar a rasgação literal da seda.
As cartas de fãs são tão importantes para a avaliação de uma obra televisiva quanto o Ibope. Atores que recebem poucas cartas não têm as mesmas chances do que aqueles que carregam toneladas de papel pra casa. Eventualmente, as emissoras de TV anunciam seus campeões de correspondência e, portanto, seus próximos astros.
Existem a meu ver, três tipos de fã: ver, ser e ter.
O "ver" integra aquela camada de pessoas cuja admiração não se torna incômoda, que quando reconhece o artista, faz questão de cumprimentá-lo, mas nunca ultrapassa esse limite. Esse é o fã que se torna admirado pelo próprio ídolo. Geralmente toma o tempo do astro por poucos segundos de forma simpática e amigável.
O "ser" já é mais complicado. Ele persegue o artista a certa distância, mas persegue sempre. Muda o cabelo, as roupas, a maneira de falar, andar, agir para ficar de acordo com a personalidade do objeto de sua afeição. Recorta fotos de revistas para decorar as paredes do quarto, sabe qual o signo, os gostos, os pratos prediletos, é capaz de fumar a mesma marca e beber as mesmas bebidas só para se tornar mais próximo de seu ídolo.
Seu sonho maior é se tornar aquela pessoa. Por isso é tão fácil entender por que os diretores e chefes de elenco costumam colocar atores que fizeram sucesso num determinado papel para interpretar personagens semelhantes em outros trabalhos, o chamado "typecast", porque eles também não passam de fãs deste ou daquele ator.
O "ter" é a mais perigosa forma de fã. Caetano Veloso que o diga, e seu colega Gilberto Gil até compôs uma música pra eles, os tietes.
Esses fulanos passam a fazer parte da vida do coitado do astro, que, na sua ingenuidade, abre as portas da sua vida para essas pessoas. Essas, por sua vez, acreditam que sejam apenas "amigos". Geralmente se tornam secretários, assistentes, cabeleireiro ou seja qual for o cargo subalterno que lhes apresente. Sua função é não permitir que o "ver" e o "ser" se aproximem nunca da estrela, que o "ter" considera só sua.
Ele toma conta do objeto de sua adoração com a mesma garra que o Tio Patinhas cuida de sua moeda número um. Por isso é que é fácil e ao mesmo tempo chocante entender quando um fã mata seu ídolo, como nos casos de John Lennon, Selena e da atriz adolescente Rebecca Schaffer, que há alguns anos foi assassinada na porta de sua casa em Los Angeles por um sujeito que apenas declarou: "Eu era seu maior fã".

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