São Paulo, segunda-feira, 24 de março de 1997
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"Srta. Else" se arrasta na pesquisa

NELSON DE SÁ
DO ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Márcio Aurélio é certamente um grande, talvez o maior, formalmente que seja, professor de teatro. Lida com o palco como um professor, trabalha linguagens de cena como alguém que está a apresentar, aos atores, ao público, com atenção carinhosa, o teatro.
Apaixonado por Brecht, leva-o à cena, aberta, didaticamente, na dosagem certa do distanciamento ou, melhor dizendo, na dialética.
Ensinou e ensina atores, que lapidam os seus talentos com ele; casos de Leonardo Medeiros, já correndo sozinho, e, nesta "Srta. Else" como em outras peças, sempre em crescimento, Débora Duboc.
No palco, trabalha a cenografia e a própria construção ou desconstrução dos textos com um cuidado escolar. Encontrou em "Srta. Else" uma maneira de fazer do pensamento diálogo, sem frase perdida, à toa no palco. O desenho quase geométrico do texto é único, uma verdadeira pesquisa.
Mas pesquisa não faz teatro, e "Srta. Else", sem ficar muito claro por quê, com todo aquele humor encontrado pelo diretor/adaptador, é exaustiva. Não demora e está todo o espetáculo, sem explicação, arrastando-se, pesado, como se pedindo alguma sujeira, alguma imperfeição sincera.
Há imperfeições, como a falta de uma ligação concreta entre a cenografia multimídia, com telas de televisão, microfones e jornais ao fundo, com a ação. Mas não são sujeiras assim que pede o espetáculo. Ele pede o que Débora Duboc chega muito perto de alcançar.
Ela se joga no personagem, descontrolada; é nela mesma um espetáculo quase à parte, levada pelos pensamentos expressos pelos demais atores. Faz rir e emociona, no seu conflito engraçado quanto a desnudar-se ou não, por algum dinheiro, para salvar o pai falido.
Mas estão presentes no ar, acima da atuação, os experimentos desenvolvidos pelo diretor-professor nos últimos anos, auto-referências formais que vão de dissolver o personagem por vários atores, como no seu melhor espetáculo, "A Comédia dos Erros", ou os choques sensoriais na platéia.
Outros estudos se incorporam, de experiências vistas, do Wooster Group, na cenografia, de um certo sarcasmo moral rodrigueano, no texto e na interpretação. Deveria ser uma bela montagem, mas pára no caminho, perdida, talvez, na própria consciência.
(NS)

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