São Paulo, segunda-feira, 24 de março de 1997
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CDs tiram do baú orquestras de dança

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Mais um saboroso capítulo da história da música instrumental brasileira salta do baú das gravadoras, sob a forma de CDs.
Agora é a vez das orquestras que animaram programas de rádio, festas e bailes durante décadas, até serem barradas pelo rock.
Nomes essenciais do gênero, como os dos maestros Severino Araújo, Sylvio Mazzucca, Portinho e Erlon Chaves, retornam nos dois primeiros volumes da série "Grandes Orquestras" -lançamento da Continental.
Autor do projeto e da seleção do repertório, Roberto Ameriot, 52, diz que essa antologia segue a política de aproveitar ao máximo o enorme arquivo da gravadora.
"O acervo da Continental é muito bom. Já estava na hora de fazer algo na área da música instrumental, que anda um pouco esquecida ultimamente", diz o gerente de marketing estratégico.
Nessa mesma linha, Ameriot projetou também a série "Grandes Instrumentistas".
"Big bands"
Os três primeiros volumes misturam medalhões do ramo, como Waldir Azevedo, Altamiro Carrilho, Dilermando Reis e Sivuca.
Calcadas nas "big bands" norte-americanas, que agitaram os salões dos anos 30 e 40 com seus naipes de saxofones, trompetes e trombones, as orquestras brazucas injetaram boas doses de jazz na música instrumental brasileira.
É o que fica evidente nas frases que o maestro Portinho escreveu para os metais de sua orquestra, em 1965, num delicioso arranjo de "Minha Namorada" (de Carlos Lyra e Vinicius de Moraes), incluído no primeiro volume da série.
O mesmo vale para os improvisos tipicamente jazzísticos que os músicos da orquestra de Erlon Chaves exibem em uma suingada versão de "Balanço Zona Sul" (de Tito Madi), gravada em 1971.
Outros momentos preciosos ficam por conta das orquestras de Severino Araújo e Carioca. Elas emprestam um malandro toque de gafieira a "O Orvalho Vem Caindo" (de Noel Rosa e Kid Pepe) e "Mulata Assanhada" (de Ataulfo Alves), respectivamente.
Se o repertório do primeiro volume é dedicado à música brasileira, no segundo o foco se volta para o pop internacional. Com um pé na cafonice, vai de Beatles ("Yesterday") a Charles Chaplin ("Limelight"), passando por boleros e canções italianas.
Românticos de Cuba
Nomes-fantasias, como os das orquestras Los Tropicalientes, Replay Band ou Los Aztecas, escondem, na verdade, instrumentistas e arranjadores brasileiros.
A exemplo de cantores que gravavam em inglês fingindo ser estrangeiros, como Terry Winter ou Morris Albert, várias orquestras utilizaram esse mesmo truque para vender sua música instrumental, nos anos 70.
Na época, quem comprou o LP da orquestra Românticos de Cuba jamais imaginaria que estava ouvindo arranjos de Radamés Gnattali ou Lyrio Panicalli.
Não se sabia também que a pomposa The Pan American Orchestra era regida pelo maestro Severino Filho. Ou ainda que Bob Fleming era apenas um pseudônimo oportuno de Moacir Silva.
É uma pena que as reduzidas fichas técnicas da coleção não tenham revelado os músicos verdadeiros -o que só valorizaria mais essa nova edição.
A série deve continuar. "Não esperávamos uma repercussão tão boa", diz Ameriot, que já planeja para agosto outros três volumes com orquestras brasileiras. Prepara também mais três CDs da série "Grandes Instrumentistas".

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