São Paulo, quarta-feira, 26 de março de 1997
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O negro Pitta

GILBERTO DIMENSTEIN

O desgaste da imagem do prefeito de São Paulo, Celso Pitta, acusado de fraude com títulos públicos, é um atraso pedagógico. Qualquer brasileiro seriamente democrata, malufista ou antimalufista, deveria estar preocupado.
Pitta já seria raridade estatística no Brasil por ser negro com curso superior. De acordo com dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), 1,7% dos negros concluem o segundo grau -desses, apenas 18% ingressam na faculdade.
Ele foi mais longe. Nunca, em toda a história brasileira, um negro ocupou cargo eletivo tão importante e de tamanha visibilidade nacional quanto a Prefeitura de São Paulo.
Seu sucesso ajudaria a diminuir o preconceito ainda dominante na sociedade brasileira, que vê superioridade intelectual nos brancos e desonestidade nos negros.
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Ao contrário do Brasil, os EUA desenvolvem uma elite intelectual negra, o que significa força política.
Segundo números do governo americano, 86% dos negros concluem o segundo grau, número idêntico ao de brancos; 15% entram na faculdade.
Atualmente, 3 milhões têm diploma universitário. Detalhe: de cada 100 negros que entram em Harvard, o olimpo universitário americano, 95 se formam.
Os números não significam que os EUA sejam um paraíso racial. Há mais jovens negros nas cadeias do que nas universidades.
Mas eles conseguem produzir intelectuais e profissionais liberais negros que têm pleno acesso à educação, ao consumo, à mídia, que bombardeiam preconceitos por meio de palestras, livros, artigos em jornais, filmes, TVs. Basta ver a platéia durante a cerimônia da entrega do Oscar.
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O negro de maior destaque no Brasil continua sendo Pelé, notabilizado mais pelo que fez com os pés do que com a cabeça. Em seu primeiro discurso político, disse que os brasileiros não estavam preparados para votar.
Nesse deserto de igualdade racial, revelador de um país injusto, subdesenvolvido e racista como é o Brasil, o sucesso de Celso Pitta seria importante vitrine.
Essa vitrine, no entanto, só está recebendo pedradas, devido aos indícios sólidos de que Pitta estaria envolvido em irregularidades. Ele está prestes a se tornar um aleijão político precocemente.
Se for provada sua culpa será bom para nossa educação política -mas um retrocesso para nossa educação racial.
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PS - Está disponível por e-mail um texto sobre a situação dos negros nos EUA. Os números mostram que, apesar dos avanços, a discriminação continua, mas comparando com o Brasil os negros americanos vivem no paraíso.

Fax: (001-212) 873-1045
E-mail gdimen@aol.com

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