São Paulo, sábado, 29 de março de 1997
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'Vestido de Noiva' é encenada nos EUA

ADRIANE GRAU
ENVIADA ESPECIAL A LOS ANGELES

Num palco de teatro em Beverly Hills, a desnorteada Alaíde (Stephanie Moffett) parece ter passado uma eternidade tentando ajeitar um enorme pedaço de jérsei branco sobre o tablado. Sob direção de Paul Warner, a famosa personagem de "O Vestido de Noiva" leva 2h20min se debatendo com fragmentos de memória que arrastam a platéia pelas espirais de emoções criadas por Nelson Rodrigues.
A peça, com diálogos em inglês, foi montada com o elenco do Theatre Forty a partir do texto traduzido por Toby Coe e por Joffre Rodrigues, filho do dramaturgo.
A temporada de sete semanas se encerra em 27 de abril. Segundo o diretor Paul Warner, o novo texto, se aproxima muito mais do original que a tradução anterior feita pela Universidade do Texas.
"Mesmo sendo mais americanizado, usa linguagem coloquial, como acontece na versão em português", diz ele.
Ano 50
Vários recursos usados pelo diretor também contribuem para a americanização da tragédia brasileira. As canções extraídas de musicais da Broadway e os vestidos saídos de brechós remetem aos Estados Unidos dos anos 50.
"Naquela época a família daqui era muito controladora", explica Warner. "Os musicais, a televisão e a literatura refletem fragmentos das experiências de Alaíde durante sua vida".
Peça expressionista
A peça foi escrita por Nelson Rodrigues em 1943 e imediatamente causou polêmica na então ultraconservadora sociedade brasileira.
Em sintonia com as influências internacionais que sempre permearam a arte nacional, o escritor faz referência ao tema de "E o Vento Levou..." e às marchas nupciais e fúnebres. Segunda Warner, isso facilitou a montagem em outra língua, pois guia a platéia por sentimentos comuns.
Warner admite que o estilo de Rodrigues poderia facilmente se tornar ininteligível para o público estrangeiro.
"Eu adoro isso. Não acho que ninguém tem que entender a peça, apenas senti-la. É expressionista", diz. "Especialmente nos EUA, onde todos são desesperados para entender tudo".
Tirando vantagem do que foi definido pelo semanário "L.A. Weekly" como "um infindável colapso mental e passeio de montanha russa que é assombrado por pesadelos, sendo ao mesmo tempo uma singela afirmação de vida", Warner resumiu em dois atos as alucinações de Alaíde.
Warner, um ítalo-americano de 31 anos, é um diretor experiente que já dirigiu dois filmes sob a tutela do instituto Sundance. "Fall Time" tem no elenco Mickey Rourke e Stephen Baldwin. Na Broadway, ele dirigiu Daryl Hannah em "Out in America".
Ele tem planos ambiciosos para "Vestido de Noiva". "Eu imagino vê-la numa produção maior na Broadway, e acho que os europeus também deveriam assisti-la. É muito melhor que 'O Crepúsculo dos Deuses' e toda aquela porcaria de Andrew Lloyd Weber", afirma.
A peça chegou nas mãos do diretor graças a Mauricio Zacharias, 34, roteirista da Conspiração Filmes. "Sou da geração criada sob a ditadura militar e não li Nelson Rodrigues na escola", diz Zacharias, que mora em Nova York.
"Li a peça quando estudava na UCLA em 92 e mostrei para o Paul, pois sabia que seu talento conseguiria criar uma montagem excepcional."
A coreografia de Joanie Fox é apontada por ambos como responsável pelo ritmo alucinante do elenco. "Trabalhei com padrões de respiração e melhorei seu preparo físico para que aguentassem as 2h20min no palco", diz ela, que já ensinou dança no Brasil num programa de intercâmbio da Dance Magazine há seis anos.

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