São Paulo, domingo, 30 de março de 1997
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PF suspeita que norma do BC facilita lavagem de dinheiro

FÁBIO SANCHEZ
DA REPORTAGEM LOCAL

A Polícia Federal já tem a pista de como o dinheiro enviado para o exterior pelas empresas que participam das operações investigadas pela CPI dos Precatórios retornou ao país legalmente, de forma autorizada pelo próprio Banco Central.
A PF acredita que o dinheiro tenha retornado ao país por meio do Anexo 4, uma norma do Banco Central que permite investimentos de grupos de empresas estrangeiras no mercado nacional.
Por essa norma, regulada por uma resolução do Conselho Monetário Nacional, empresas estrangeiras podem investir no país aplicando em ações nas bolsas de valores ou em debêntures -títulos emitidos por empresas para captação de recursos no mercado.
Um técnico da CPI que participa da avaliação de documentos obtidos em bancos disse à Folha que há, no mercado, pelo menos R$ 18 bilhões em investimentos estrangeiros que entraram no país pelo Anexo 4. Consultada, a assessoria do BC confirmou a informação.
O técnico afirmou que não há como saber quais são as empresas que estão investindo nas bolsas.
O delegado João Carlos Abraços, que participou das investigações da CPI, acredita que o Anexo 4 é "um dos maiores instrumentos para a lavagem de dinheiro".
A PF suspeita que os envolvidos nas negociações se organizaram em grupos no exterior. Esses grupos trariam dinheiro ao país na forma de investimentos em outras empresas integradas ao esquema.
Na segunda-feira passada, os senadores Romeu Tuma (PFL-SP) e Eduardo Suplicy (PT-SP) foram à sede da distribuidora Split, em São Paulo, suspeita de operar com empresas "laranjas". "Queremos saber se a Split operou com investidores externos", afirmou Tuma.
Debêntures
Uma das pistas sobre o retorno do dinheiro ao país que mais chamou a atenção dos senadores são as operações do "laranja" Ibraim Borges Filho, dono da IBF Factoring. Ele foi chamado à PF no dia 20 para depor sobre o assunto.
Borges Filho disse que movimentou cerca de R$ 70 milhões na compra de debêntures, conseguindo um lucro considerado alto pela PF: cerca de R$ 30 milhões, 42% do total aplicado.
Apesar disso, disse que ficava com apenas 0,3% desse lucro. O resto iria para as empresas que, segundo ele, lidavam com sua conta corrente, como a Split, do empresário Enrico Picciotto.
A PF também suspeita que outra operação de Borges Filho tenha servido para "esquentar" dinheiro vindo do exterior. Ele fez uma operação que resultou em um crédito de R$ 18,5 milhões junto ao Banco Pontual, em maio de 96.
Na operação, denominada "export note", o dinheiro financiaria exportações que não aconteceram. Como o dinheiro não foi usado, ficou investido no banco.
Também está sendo investigada uma carteira de investimentos no Banco Seller S/A, fechado pelo BC. A carteira era administrada por uma empresa sediada nas Ilhas Cayman, paraíso fiscal no Caribe.
O Seller mantinha relações com Manoel Moreira Neto, dono de várias empresas "laranjas" com contas no Beron (Banco do Estado de Rondônia), suspeito de operar com envolvidos no esquema.

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