São Paulo, domingo, 30 de março de 1997
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Emissões tiveram aprovação relâmpago

FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Oito das dez autorizações que o Senado concedeu a cidades e Estados para emissão de títulos foram aprovadas em regime de urgência.
Isso significa que algumas autorizações foram dadas sem que os senadores designados relatores soubessem exatamente do que se tratava a matéria que estavam relatando para os colegas.
Há duas semanas a CPI decidiu que os senadores-relatores poderão ser ouvidos ao longo da investigação. Mas a direção da CPI ainda não marcou data nem deixou claro se esses parlamentares terão os sigilos bancário e telefônico quebrados.
"Só li o relatório que foi preparado pela assessoria parlamentar", diz o senador Nabor Júnior (PMDB-AC), que foi o relator do pedido de Santa Catarina, num valor de R$ 552 milhões.
Nesses casos de requerimento de urgência, o pedido para emissão de títulos segue muitas vezes diretamente para o plenário. Em casos normais, há uma análise e votação no âmbito da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado.
Para o episódio de Santa Catarina, a velocidade de tramitação foi grande. O relatório preparado pelo Banco Central foi lido em plenário no dia 9 de outubro passado.
No mesmo dia 9 de outubro, a assessoria já tinha um relatório pronto. O senador Nabor Júnior foi escolhido relator. Leu o parecer e procedeu-se a votação, com 43 votos sim, 3 não e 7 abstenções.
Processo viciado
A Folha fez uma análise dos dez processos autorizativos do Senado para que Estados e municípios emitissem títulos para pagar precatórios (dívida resultantes de decisões judiciais).
Embora todos os senadores tenham explicações para os seus relatórios favoráveis, há muitos vícios no processo de aprovação:
1) urgência - oito processos tramitaram sob regime de urgência. Nos dois casos em que não houve urgência, os valores eram relativamente pequenos -Guarulhos (R$ 15 milhões) e Rio Grande do Sul (R$ 7,7 milhões);
2) BC leniente - dos dez casos, em apenas dois (Osasco e Campinas) o BC desaconselhou a emissão dos títulos;
3) relatores lenientes - todos os relatores acabaram apoiando os pedidos, embora alguns tenham feito ressalvas;
4) documentos incompletos - os dossiês enviados pelos Estados e municípios eram quase sempre incompletos. BC e Senado pediam alguns complementos e acabavam se satisfazendo, mesmo que a documentação continuasse capenga.
Os relatores do PT
Cada senador que relatou os dez processos de títulos para pagamento de precatórios tem uma desculpa para sua posição.
Dois senadores petistas foram relatores. Eduardo Suplicy (SP) e Lauro Campos (DF) foram favoráveis à emissão de títulos por Campinas e Osasco, respectivamente.
Campos sequer se lembra que o BC foi contra a emissão dos títulos. "De cabeça, não me lembro", disse à Folha. Apesar disso, afirmou que melhorou o relatório que lhe foi entregue pela assessoria.
"Introduzi uma exigência para que a totalidade dos recursos fosse usada no pagamento de precatórios", disse Campos. Na realidade, a Constituição já exige isso.
Suplicy tem documentos demonstrando que foi enganado pelo secretário de Finanças de Campinas à época, Geraldo Biasoto, que lhe prometera gastar o dinheiro no pagamento de precatórios.
Biasoto depôs à CPI e Suplicy guardou a transcrição de um trecho no qual o ex-secretário campineiro admite ter mentido para o senador quando solicitou a autorização para emitir títulos.
"Senador (Suplicy), gostaria muito de poder estar aqui honrando minha palavra, que foi dada naquele momento a vossa excelência. Infelizmente, eu não posso", disse Biasoto à CPI. Campinas usou dinheiro dos títulos para pagar outras despesas além de precatórios.

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